Ora viva. Deixa-me cá puxar de uma cadeira e explicar-te isto como deve ser, porque essa ideia de que os buracos negros são aspiradores cósmicos com fome insaciável é um mito que se espalhou mais depressa que fofoca em dia de feira.
Se estivéssemos ali no Gerês a olhar para o céu, eu diria-te logo: "Calma, que o universo não é assim tão apressado a comer-se a si próprio."
Primeiro, tira da ideia que o buraco negro no centro da Via Láctea — o Sagitário A* — está ali à espera para nos engolir a todos. Um buraco negro não "suga" nada. Ele exerce gravidade, tal como o Sol. Se substituísses o Sol por um buraco negro com a mesmíssima massa, a Terra continuaria a orbitar exatamente no mesmo sítio. Ficávamos às escuras e íamos congelar num instante, é certo, mas não seríamos "sugados".
As estrelas na nossa galáxia estão em órbitas estáveis. Elas movem-se com uma velocidade tal que a força centrífuga equilibra a puxada gravitacional do centro. Para uma estrela ser "comida", ela teria de perder quase todo o seu momento angular; ou seja, teria de levar um encontrão monumental para cair lá para dentro. A maioria das estrelas vai morrer de velhice muito antes de chegar sequer perto do horizonte de eventos.
Dizes que "cada galáxia tem um buraco negro no centro", mas olha que não é bem assim. Embora a maioria das galáxias grandes e espirais os tenham, existem galáxias anãs e irregulares que vivem muito bem sem um "patrão" supermassivo no meio.
Muitas vezes, esses gigantes no centro são o resultado de fusões. Quando duas galáxias chocam (como a Via Láctea vai chocar com Andromeda daqui a uns milhares de milhões de anos), os seus buracos negros centrais acabam por se encontrar e fundir num só, ainda mais massivo. É um baile cósmico de proporções bíblicas, mas mesmo nessas colisões, a maior parte das estrelas nem se toca; o espaço é demasiado vazio para isso.
É preciso entender que nem toda a estrela tem currículo para ser buraco negro. A nossa estrela, o Sol, é um bocado "comum" para essas andanças. Quando o combustível acabar, ele vai inchar, tornar-se uma gigante vermelha e depois encolher até ser uma Anã Branca. Para se tornar um buraco negro, uma estrela precisa de ter uma massa colossal — estamos a falar de pelo menos 20 vezes (embora algumas fontes dizem que apenas 8 vezes é suficiente por motivos muito específicos) a massa do Sol.
Quando estas gigantes morrem, explodem numa supernova e o que sobra é comprimido até que nem a luz consegue escapar.
Se avançarmos o relógio biliões e biliões de anos, o cenário muda. As estrelas grandes morrem rápido. As pequenas, as Anãs Vermelhas, são as poupadas da vizinhança; queimam o seu hidrogénio tão devagarinho que podem durar triliões de anos. Elas serão as últimas luzes acesas no universo.
Eventualmente, sim, as estrelas apagam-se. Ficaremos com um universo de:
•Anãs Negras: Anãs brancas que arrefeceram tanto que já não brilham.
•Estrelas de Neutrões: Cadáveres estelares densíssimos.
•Planetas Órfãos: Rochas geladas a vaguear no vazio sem sol.
•Buracos Negros: Que continuarão lá, silenciosos.
Agora, será que no fim só sobram buracos negros? É uma possibilidade teórica na chamada "Era dos Buracos Negros". Mas há um pormenor: Stephen Hawking propôs que os buracos negros também "evaporam" através da Radiação de Hawking. Demora um tempo que a nossa cabeça nem consegue processar (um 1 seguido de 100 zeros em anos), mas até eles podem desaparecer.
No entanto, nada disto é garantido. Não sabemos se a Energia Escura vai continuar a expandir o universo até rasgar o próprio tecido do espaço (o Big Rip) ou se tudo vai arrefecer até à morte térmica total. O universo é um bicho complexo e nós ainda estamos a tentar ler o prefácio do livro.
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