Esta concepção artística mostra a eterna alvorada em TRAPPIST-1f, numa área que poderia ser habitável. No céu, veem-se outros mundos bem próximos, 1e (crescente menor), 1d (crescente maior) e 1c (pontinho brilhante junto ao sol). [Imagem: NASA/Caltech]
Enquanto seu sol emite partículas muito energéticas, os sete planetas desse sistema trocam influências gravitacionais entre si. Dependendo das condições, esse ambiente pode facilitar ou complicar o surgimento da vida.
No final de 2015, o Transiting Planets and Planetesimals Small Telescope, um telescópio robótico belga instalado no Chile, encontrou seu primeiro sistema planetário. Batizado de TRAPPIST-1, esse sistema — situado a 40 anos-luz daqui, na constelação de Aquário — poderia ser logo esquecido como o começo de um longo catálogo, mas chamou a atenção porque observações subsequentes revelaram que ali existe um conjunto de sete planetas terrestres.
Desde então, TRAPPIST-1 tornou-se sensação tanto na comunidade científica quanto na imprensa em geral. Suas características são simples e fascinantes: uma estrela de tipo M, menor e mais fria que o Sol, é cercada por sete planetas tão próximos entre si e de sua estrela que caberiam dentro da órbita de Mercúrio. Há dois anos, mostramos que essas condições podem criar armadilhas à existência de vida nos mundos de TRAPPIST-1. No ano passado, vimos que algumas dessas armadilhas são escorregadias.
O principal problema é que tamanha proximidade com seu astro-rei faz com que esses sete planetinhas — o maior deles, TRAPPIST-1g, é só um pouco maior e mais pesado que a Terra — sejam gravitacionalmente travados. Isso quer dizer que, como a Lua, eles voltam sempre o mesmo hemisfério para seu sol. Com um dia perpétuo de um lado e uma noite imutável de outro, a vida nesses planetas se restringiria apenas a uma estreita faixa onde haveria um eterno amanhecer (ou por-do-sol, dependendo do ponto de vista).
Novas pesquisas têm revelado duas condições de TRAPPIST-1 e seus planetas que podem ser tanto mais hostis quanto mais hospitalares à vida: os ventos solares e as forças gravitacionais. Atualmente, acredita-se que três dos planetas desse sistema estariam dentro da zona habitável, onde a temperatura seria adequada ao surgimento de água líquida. Entretanto, essa zona poderia ser aumentada, abrangendo outros planetas.
Comparativo entre as zonas habitáveis de TRAPPIST-1 acima) e do nosso sistema solar (abaixo). Forças gravitacionais e a atividade eletromagnética podem incluir os planetas mais internos e externos de TRAPPIST-1 na zona plenamente habitável (em verde). [Imagem: NASA/JPL-Caltech]
Um dos motivos dessa ampliação da zona habitável é o cabo-de-guerra gravitacional jogado entre os planetas. Segundo estudo de Hamish Hay, graduando do Laboratório Lunar e Planetário de Harvard (EUA), os planetas de TRAPPIST-1 são tão próximos entre si que suas interações gravitacionais poderiam causar marés consideráveis. “Quando um planeta ou lua deforma-se pelas marés, sua fricção interna vai criar calor”, explica Hay ao Phys.org. Outro motivo seria, paradoxalmente, a intensa atividade eletromagnética de TRAPPIST-1. Mas vamos começar pelas marés.
Vida aquática e noturna
Graças a esse calor interno causado pelo estica-e-puxa da gravidade, outros planetas de TRAPPIST-1 poderiam se tornar habitáveis. Hay descobriu que o sexto planeta, TRAPPIST-1g, sofre influências gravitacionais equivalentes entre sua estrela e os demais planetas. Nesse caso o aquecimento interno causado pelos outros planetas é tão grande quando o causado pela estrela. Isso significa um aquecimento bem intenso — tanto que, se for um mundo oceânico, como Europa, as marés fariam de TRAPPIST-1g um lugar de águas mornas. Assim, embora esteja fora da zona habitável por distância, o 1g poderia ser habitável pela sua temperatura.
No extremo oposto, os planetas mais próximos do sistema, TRAPPIST-1b e 1c, já sofrem com o calor excessivo causado pela proximidade com seu sol. No entanto, ali, as forças de maré poderiam ter um efeito de resfriamento. As interações gravitacionais entre esses mundos seriam, segundo Hay, o suficiente para estimular atividades vulcânicas, que geram gases e podem sustentar uma atmosfera. O lado diurno desses planetas ainda seria quente demais pra viver, mas uma atmosfera de origem vulcânica ajudaria a fazer esse calor circular, evitando o congelamento completo do lado noturno. Isso também amplia a zona habitável do sistema.
Bombas de Prótons
Outro grande problema desse sistema extrassolar é a intensa atividade eletromagnética de sua estrela. Embora seja menor e mais fria que o Sol, TRAPPIST-1 emite um verdadeiro dilúvio de prótons altamente energéticos. “O fluxo dessas partículas no sistema TRAPPIST-1 pode ser até 1 milhão de vezes maior que o fluxo de partículas na Terra”, estima Federico Franceschi, do Centro de Astrofísica de Harvard.
No nosso planeta, esse tipo de fluxo de prótons é quase inofensivo e de vez em quando gera auroras nas áreas polares. Nos mundos de TRAPPIST-1, porém, explosões na superfície solar empurram a maior parte desse fluxo colossal para os planetas. A pesquisa de Franceschi revelou que, graças ao alinhamento do campo magnético da estrela, o planeta mais atingido por esse bombardeio de prótons seria o quarto do sistema, TRAPPIST-1e.
Embora um campo magnético pudesse proteger o ambiente de 1e, ele teria que ser centenas de vezes mais forte que o nosso, o que parece bastante improvável. Isso não quer dizer que esse seja um mundo estéril. Os oceanos dali poderiam ser uma boa barreira contra os prótons mais destrutivos, especialmente se forem profundos. Lá, os efeitos das marés poderiam ajudar na proteção contra os ventos solares. Mesmo que não haja oceanos em 1e ou que eles não sejam muito fundos, ainda existe uma pequena possibilidade de que o lado noturno do planeta seja menos bombardeado e tenha uma temperatura adequada à existência da vida.
Publicados em artigo conjunto no The Astrophysical Journal da semana passada, os resultados das pesquisas de Hay e Franceschi ajudam não apenas a determinar melhor as condições de habitabilidade de TRAPPIST-1 mas também devem indicar que fatores como a atividade eletromagnética e as forças de maré devem ser levadas em conta no estabelecimento das zonas habitáveis, especialmente em outras estrelas do tipo M.
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