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terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Um Teste Mais Preciso

 Um grupo internacional, envolvendo pesquisadores de instituições britânicas, americanas e alemãs, conseguiu testar com precisão notável a descrição que a teoria faz de uma lente gravitacional. Foi o teste mais preciso já feito envolvendo observações extragalácticas, ou seja, de fora da Via Láctea. E isso acaba sendo um ponto a mais para a energia escura.

Muitas vezes confundida com a matéria escura, ela é completamente diferente — em natureza e efeitos. Enquanto a tal matéria escura é algo que gera mais gravidade (por exemplo acelerando as estrelas da periferia das galáxias), a energia escura é algo que parece agir contra a gravidade, acelerando a expansão do Universo.

A descoberta de que o cosmos não só está em expansão, mas em expansão acelerada, é relativamente recente. Foi em 1998 que vieram as primeiras evidências nesse sentido, do estudo de supernovas distantes. Estudar objetos nas profundezas do espaço é como entrar numa máquina do tempo, pois os vemos como eles eram quando a luz partiu deles, por vezes muitos bilhões de anos atrás. Assim, é possível estudar o “estado do Universo” ao longo de toda a sua história, estimada em 13,8 bilhões de anos, e constatar que, nos primeiros 8 ou 9 bilhões de anos, a expansão inicial estava freando (como seria de se esperar, pela atração gravitacional mútua entre todos os objetos que existem), mas nos últimos 5 ou 6 bilhões de anos começou a acelerar, aumentando seu ritmo, movida por alguma força que ninguém sabe o que é. Você adivinhou: é o que resolveram chamar de energia escura.

Curiosamente, Einstein nos legou sua relatividade geral previamente “pronta” para lidar com essa nova força, ao introduzir em suas equações uma “constante cosmológica”. Ela representaria em essência a energia do próprio vácuo, que agiria para expandir o espaço, na contramão da gravidade. O físico alemão não era bidu, claro. Quando ele colocou esse termo na equação, era só para manter o Universo estático, como ele acreditava que fosse. Depois que o astrônomo Edwin Hubble mostrou que o cosmos estava mesmo em expansão, Einstein considerou a inclusão da constante cosmológica um erro e repudiou a alteração à teoria. Mal saberia ele que, a partir de 1998, essa alteração se tornaria bem conveniente, respondendo pela energia escura.

Ainda não sabemos se de fato se pode tratar a energia escura como a constante cosmológica de Einstein. Para isso, ela teria de ser (1) constante (duh!) e (2) uniforme em todo o espaço. Como nossos estudos da aceleração da expansão do Universo ainda estão relativamente no começo (20 anos desde a descoberta inicial), ainda não dá para afirmar que esse seja o caso, embora até agora seja o modelo preferencial dos cosmólogos.

Preferencial, contudo, não quer dizer obrigatório. E é óbvio que há físicos que resolveram pensar de outra maneira. A exemplo do que aconteceu no caso da matéria escura, houve quem pensasse: e se, em vez de haver essa tal de energia escura, o erro estiver na nossa compreensão da gravidade? E se uma teoria alternativa à relatividade geral possa explicar a aceleração da expansão naturalmente, sem introduzir um algo a mais, como a constante cosmológica?

Entra o estudo desta sexta-feira. Ele se debruçou sobre a lente gravitacional forte produzida por uma galáxia relativamente próxima. A teoria de Einstein prevê que a gravidade de um objeto pode agir como uma lente, desviando os raios de luz de um objeto que esteja ainda mais distante.

Ao observarem com o Telescópio Espacial Hubble e o VLT (Very Large Telescope), no Chile, a galáxia ESO 325-G004, os astrônomos liderados por Thomas Collett, da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido, notaram que ela produziu uma lente gravitacional que curvou a luz de uma galáxia bem mais afastada formando um anel ao redor da galáxia-lente.

Diagrama mostra como a gravidade de uma galáxia curva a luz de outra mais distante e produz um anel. (Crédito: Nasa/ESA/STScI)

Essas observações do anel permitiram contrastar a predição da relatividade geral com a de teorias alternativas que, incidentalmente, dispensam a energia escura. E o resultado se mostrou consistente com a formulação de Einstein para a gravidade.

O resultado não é tão esmagador quanto o que diz respeito à matéria escura. Dadas as incertezas nas observações, a única coisa que se pode afirmar é que, pelo menos em escalas que envolvem 6.000 anos-luz, a gravidade se comporta exatamente como a relatividade geral descreve. Se em escalas ainda maiores há um desvio que indique a necessidade de uma teoria alternativa, futuros testes terão de dizer.

O problema é que testar a relatividade geral não é moleza, por uma razão muito simples: a gravidade é uma força muito fraquinha, comparada às outras conhecidas. Isso significa que você precisa de objetos com massa gigantesca para produzir efeitos como o das lentes gravitacionais fortes. E aí o difícil é encontrar lentes que estejam próximas o suficiente da Terra para que incertezas adicionais introduzidas por modelos cosmológicos não atrapalhem as medições.

De toda maneira, o estudo é mais um reforço à ideia de que a energia escura é mais bem interpretada como algo diferente da gravitação (à la constante cosmológica) do que como um efeito gerado por uma compreensão imperfeita da gravidade em grandes escalas.

Por ora, o modelo cosmológico padrão, que abraça a relatividade geral como ela é e incorpora a existência de matéria e energia escuras como ingredientes essenciais do Universo, continua firme e forte, a despeito de todas as tentativas de encontrar rachaduras em suas fundações.

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