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quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Identificada a origem das erupções dos buracos negros

 Investigadores do Instituto Flatiron e colaboradores descobriram que a quebra e reconexão das linhas do campo magnético perto do horizonte de eventos libertam energia do campo magnético de um buraco negro, acelerando as partículas que geram erupções intensas. As descobertas sugerem novas e excitantes possibilidades na observação de buraco negros.


Um instantâneo das novas simulações de buracos negros. Crédito: B. Ripperda et al., Astrophysical Journal Letters 2022

Os buracos negros nem sempre "estão no escuro". Os astrónomos avistaram luz intensa a brilhar mesmo para lá do horizonte de eventos de buracos negros supermassivos, incluindo o que se encontra no núcleo da nossa Galáxia. No entanto, os cientistas não conseguiram identificar a causa destas erupções para além da suspeita de envolvimento de campos magnéticos. Utilizando simulações computorizadas de poder e resolução inigualáveis, os físicos dizem ter resolvido o mistério: a energia libertada perto do horizonte de eventos de um buraco negro durante a reconexão das linhas do campo magnético alimenta as erupções, relataram os investigadores dia 14 de janeiro na revista The Astrophysical Journal Letters. 

As novas simulações mostram que as interações entre o campo magnético e o material que cai para o buraco negro fazem com que o campo se comprima, achate, quebre e volte a ligar. Esse processo acaba por utilizar energia magnética para atirar partículas quentes de plasma a uma velocidade próxima da luz para o buraco negro ou para o espaço. Essas partículas podem então irradiar diretamente alguma da sua energia cinética como fotões e dar aos fotões próximos um impulso energético. Esses fotões energéticos compõem as misteriosas erupções do buraco negro. 

Neste modelo, o disco de material previamente em queda é ejetado durante os surtos, limpando a área em redor do horizonte de eventos. Esta arrumação poderia proporcionar aos astrónomos uma visão sem obstáculos dos processos geralmente obscurecidos que ocorrem fora do horizonte de eventos. 

Um instantâneo de uma das novas simulações de buracos negros. Aqui, as linhas verdes do campo magnético são sobrepostas num mapa do plasma quente. Mesmo para lá do horizonte de eventos do buraco negro, a ligação das linhas do campo magnético apontando em direções opostas faz um ponto X onde elas se cruzam. Este processo de reconexão lança algumas partículas do plasma para o buraco negro e outras para o espaço, um passo importante na criação de erupções dos buracos negros. Crédito: B. Ripperda et al., Astrophysical Journal Letters 2022

"O processo fundamental de ligar novamente as linhas do campo magnético perto do horizonte de eventos pode aproveitar a energia magnética da magnetosfera do buraco negro para alimentar erupções rápidas e brilhantes," diz o vice-líder do estudo Bart Ripperda, bolseiro pós-doutorado do Centro para Astrofísica Computacional do Instituto Flatiron em Nova Iorque e da Universidade de Princeton. "É aqui que estamos realmente a ligar a física dos plasmas à astrofísica." 

Ripperda é coautor do novo estudo com o cientista associado do mesmo Centro, Alexander Philippov, com os cientistas Matthew Liska e Koushik Chatterjee da Universidade de Harvard, Gibwa Musoke e Sera Markoff da Universidade de Amesterdão, o cientista da Universidade Northwestern Alexander Tchekhovskoy e o cientista da University College London Ziri Younsi. 

Um buraco negro, fiel ao seu nome, não emite luz. De modo que estas erupções devem ter origem fora do horizonte de eventos do buraco negro - o limite onde a força gravitacional do buraco negro se torna tão forte que nem a luz pode escapar. O material em órbita e em queda rodeia os buracos negros sob a forma de um disco de acreção, tal como o que rodeia o buraco negro monstruoso encontrado na galáxia M87. Este material cai em cascata em direção ao horizonte de eventos próximo do equador do buraco negro. Nos polos norte e sul de alguns destes buracos negros, jatos de partículas disparam para o espaço quase à velocidade da luz. 

Identificar onde se formam as erupções na anatomia de um buraco negro é incrivelmente difícil devido à física envolvida. Os buracos negros curvam o espaço e o tempo e estão rodeados por poderosos campos magnéticos, campos de radiação e plasma turbulento - matéria tão quente que os eletrões se desligam dos seus átomos. Mesmo com a ajuda de computadores poderosos, os esforços anteriores só conseguiam simular sistemas de buracos negros em resoluções demasiado baixas para ver o mecanismo que alimenta as erupções. 

Ripperda e colegas fizeram tudo para aumentar o nível de detalhe das suas simulações. Utilizaram o tempo de computação em três supercomputadores - o supercomputador Summit no Laboratório Nacional Oak Ridge no estado norte-americano do Tennessee, o supercomputador Longhorn na Universidade do Texas em Austin e o supercomputador Popeye do Instituto Flatiron, localizado na Universidade da Califórnia, San Diego. No total, o projeto demorou milhões de horas de computação. O resultado de todo este músculo computacional foi, de longe, a simulação de mais alta resolução do ambiente de um buraco negro jamais feita, com mais de 1000 vezes a resolução dos esforços anteriores. 

A mais alta resolução deu aos investigadores uma imagem sem precedentes dos mecanismos que levaram a uma erupção de um buraco negro. O processo centra-se no campo magnético do buraco negro, que tem linhas que emergem do horizonte de eventos do buraco negro, formando o jato e ligando-se ao disco de acreção. Simulações anteriores revelaram que o material que flui para o equador do buraco negro arrasta linhas do campo magnético em direção ao horizonte de eventos. As linhas de campo arrastadas começam a empilhar-se perto do horizonte de eventos, eventualmente empurrando para trás e bloqueando o material que flui para dentro. 

Com a sua excecional resolução, a nova simulação capturou pela primeira vez como o campo magnético na fronteira entre o material a fluir e os jatos do buraco negro se intensifica, apertando e achatando as linhas do campo equatorial. Essas linhas de campo estão agora em faixas alternadas que apontam para o buraco negro ou para longe dele. Quando duas linhas que apontam em direções opostas se encontram, podem partir-se, voltar a ligar e emaranhar-se. Entre os pontos de ligação, forma-se uma bolsa no campo magnético. Essas bolsas são preenchidas com plasma quente que ou cai no buraco negro ou é acelerado para fora no espaço a velocidades tremendas, graças à energia retirada do campo magnético nos jatos. 

"Sem a alta resolução das nossas simulações não seria possível capturar a dinâmica e as subestruturas", diz Ripperda. "Nos modelos de baixa resolução, a reconexão não ocorre, pelo que não há nenhum mecanismo que possa acelerar as partículas." 

As partículas de plasma no material catapultado irradiam imediatamente alguma energia como fotões. As partículas de plasma podem mergulhar ainda mais na faixa energética necessária para dar aos fotões próximos um impulso de energia. Esses fotões, quer sejam transeuntes quer sejam os fotões inicialmente criados pelo plasma lançado, constituem as erupções mais energéticas. O material propriamente dito acaba numa bolha quente em órbita nas proximidades do buraco negro. Uma tal bolha foi avistada perto do buraco negro supermassivo da Via Láctea. "A reconexão magnética que alimenta tal zona quente é a evidência conclusiva que explica essa observação," diz Ripperda. 

Os investigadores também observaram que, após algum tempo desta atividade, a energia do campo magnético diminui e o sistema é reiniciado. Depois, com o tempo, o processo começa de novo. Este mecanismo cíclico explica porque é que os buracos negros emitem erupções em horários definidos, desde todos os dias (para o buraco negro supermassivo da nossa Via Láctea) a cada poucos anos (para M87 e outros buracos negros). 

Ripperda pensa que as observações do recentemente lançado Telescópio Espacial James Webb, combinadas com as do EHT (Event Horizon Telescope) poderiam confirmar se o processo visto nas novas simulações está a acontecer e se muda as imagens da sombra de um buraco negro. "Teremos de ver", diz Ripperda. Por agora, ele e colegas estão a trabalhar para melhorar as suas simulações com ainda mais detalhe.

Fonte: Astronomia OnLine

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