O Sol, a nossa estrela particular, guarda muitos segredos. Mesmo estando a uma distância de “apenas” 150 milhões de quilômetros, ainda temos muitas perguntas sem respostas. E não preciso mencionar que, sendo a fonte vital de energia que faz o ciclo de vida na Terra se manter, essa é uma situação incômoda.
Com a dependência cada vez maior de tecnologias ligadas às redes de satélites, como comunicação e geoposicionamento, ou mesmo a extensa malha de distribuição de energia elétrica, entender os humores do Sol é fundamental. Vale lembrar que, nas épocas em que a atividade magnética do Sol é intensa, tempestades solares podem arruinar satélites em órbita da Terra, ou mesmo estações de geração de energia em sua superfície. Por causa disso, as agências espaciais e os institutos de pesquisa mantêm um programa contínuo de estudos do Sol. Seja na Terra, seja no espaço.
Por exemplo, a Nasa, a agência espacial americana, mantém pelo menos quatro satélites monitorando o Sol o tempo todo. O intuito dessa flotilha é registrar o comportamento do Sol, como o aparecimento de novas manchas solares e o surgimento de protuberâncias, por exemplo. Com o tempo e com o registro contínuo, os modelos que descrevem o comportamento do Sol e que ajudam a prever a ocorrência de tempestades violentas vão se aprimorando e vamos aprendendo a evitar situações catastróficas.
Mas, mesmo com tanto monitoramento, uma das perguntas mais antigas e intrigantes sobre o Sol permanece sem resposta.
Os modelos físicos e dados indiretos permitem deduzir que o Sol é mais quente no seu núcleo. Claro, é lá que ocorre a fusão nuclear que gera sua energia. Conforme nos distanciamos do seu núcleo, ou seja, indo em direção a sua superfície, a temperatura diminui. Partindo do núcleo com uns 15 milhões de graus Celsius, chegamos à superfície do Sol (a parte que de fato enxergamos) a uma temperatura um pouco menor que 6 mil graus. A partir deste ponto, a temperatura cai abruptamente, pois, afinal, saímos do Sol e estamos no espaço sideral.
Mas a história não é exatamente assim.
A partir da fotosfera do Sol (o termo correto para “superfície” que eu mencionei antes) existe uma estrutura muito extensa, composta por um “vento” de plasma e chamada de coroa solar. Essa coroa se espalha por milhões de quilômetros ao redor do Sol, muitas vezes mais concentrada em alguns pontos do que em outros. Essa parte se revela sempre nos eclipses solares. Até aí, beleza, mas sabe qual é a temperatura ao longo dessa estrutura? Entre 1 e 5 milhões de graus Celsius!
Pois é, o Sol tem uma parte estendida no espaço que é mais quente que seu ponto de partida: a coroa surge em um ponto da fotosfera onde a temperatura é de 6 mil graus, para se projetar no espaço e misteriosamente esquentar a mais de 1 milhão de graus.
Como pode?
Um dos objetivos da missão Parkes, a sonda que está estudando o Sol a uma distância atual de 25 milhões de quilômetros, cerca de metade da distância Sol-Mercúrio, é justamente tentar entender como a coroa solar consegue ser tão quente quanto as regiões mais centrais do Sol. A suspeita recai nas chamadas “ondas magnéticas” geradas no interior do Sol e que se propagam pelo Sistema Solar.
A origem dessas ondas ainda é motivo de debate entre os físicos solares. Sabe-se que ela deve ser gerada a partir de vibrações do campo magnético do Sol. O processo é o mesmo de quando uma corda de guitarra elétrica é tocada, fazendo o campo magnético ao seu redor vibrar. A ideia básica é que a energia que essas ondas carregam faria a cora solar se aquecer.
As tais ondas magnéticas acontecem frequentemente e são registradas por instrumentos a bordo dos satélites em órbita da Terra, por exemplo. Mas, depois de percorrer 150 milhões de quilômetros, as ondas já chegam embaralhadas, por assim dizer, impedindo uma análise mais precisa. Por isso mesmo a sonda foi mandada para tão perto do Sol.
A missão da Parker prevê se aproximar ainda mais do Sol nos próximos anos, executando manobras de sobrevoo em Vênus. A próxima delas está agendada para 26 de dezembro deste ano e, como consequência, a distância da sonda até o Sol deve encolher para 19 milhões de quilômetros. Depois disso, a sonda executará mais cinco manobras deste tipo, fazendo a sua distância até o Sol se reduzir a menos de 7 milhões de quilômetros na véspera do Natal de 2024! A essa distância, podemos dizer que ela estará tocando o Sol, pois estará posicionada nas partes mais externas de sua coroa.
A posição privilegiada da Parker vai permitir estudar as ondas magnéticas do Sol a uma distância em que elas não se sobreponham e não interfiram umas na outras. Com esses dados, esperamos, o time que comanda a sonda vai tentar entender como o plasma solar se aquece mais de 300 vezes fora do Sol e assim responder a essa pergunta de quase 100 anos.
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