No dia 25 de abril do ano passado, os mais importantes detectores de ondas gravitacionais emitiram um alerta: um “pulso” de ondas havia passado pela Terra. Isso aconteceu às 10:18 da manhã na Itália - sede do observatório Virgo, mas alta madrugada nos EUA onde estão os demais que compõem o LIGO. Alertas como esses chegam todos os dias, a maioria não passa de alarme falso, mas a análise que veio na sequência deixou todo mundo encafifado.
As ondas gravitacionais são uma das previsões da Teoria de Relatividade Geral de Albert Einstein. Ele em si não tinha percebido isso até publicar um trabalho sobre a sua própria teoria e um dos revisores do artigo sugeriu que ele desenvolvesse a ideia. Conta-se que ele ficou muito bravo com a sugestão e meio que a contragosto desenvolveu a ideia, mas de birra mandou o artigo para outra revista...
Ondas gravitacionais são minúsculas ondulações no tecido do espaço-tempo (como se fosse um gigantesco lençol vibrando) provocado por eventos extremos de objetos compactos ou com muita massa. Um objeto compacto é um objeto muito denso, ele tem muita matéria confinada em um volume muito pequeno. Exemplos deste tipo de objeto são as anãs brancas, as estrelas de nêutrons e os buracos negros. Quando eles colapsam ou se chocam, causam uma distorção no tal tecido do espaço-tempo, que se propaga como ondas pelo universo. Você pode ter uma boa ideia disso imaginando uma pedrinha caindo em um lago de superfície calma e lisa. Mas para detectá-las foi preciso um esforço tecnológico sem precedentes, tanto que a primeira detecção da história aconteceu apenas em 2015.
Os três principais observatórios de ondas gravitacionais operam de maneira conjunta. Dois deles estão nos EUA, um no estado da Louisiana e outro a 3 mil quilômetros de distância no estado de Washington, sendo que o mais recente opera na Itália. Com os 3 em atividade é possível detectar um pulso de ondas gravitacionais com grande grau de confiança e, mais ainda, apontar a posição no espaço de onde o sinal foi gerado. Todavia, neste caso em específico, apenas o detector da Louisiana estava operacional no momento do evento e o sinal chegou no limiar de detecção do observatório italiano, de modo a complicar um pouco sua análise. Sem os outros observatórios para ajudar na detecção, ficou impossível restringir a posição da origem do evento no céu.
O sinal de abril do ano passado começou a ser analisado imediatamente, fazendo-se a comparação dos registros com modelos calculados previamente que abrangem uma vasta combinação de possibilidades: colisão entre buracos negros, colisão entre estrelas de nêutrons e por aí vai. A melhor combinação de fatores que conseguiu reproduzir o sinal detectado foi uma colisão de estrelas de nêutrons. Mas não exatamente como imaginado.
A estimativa da massa total do sistema deu por volta de 3,4 vezes a massa do Sol, mas a questão é que de todos os sistemas duplos de estrelas de nêutrons da galáxia têm no máximo 2,9 massas solares. Se você repartir a massa do sistema igualmente nas duas estrelas, dá 1,7 massa solares para cada. Só que o limite para uma estrela de neutros é de, no máximo 1,44 massas solares. Acima disso a estrela colapsa em um buraco negro. Esse limite foi calculado pelo físico brasileiro Mário Schenberg em colaboração com o físico indiano Subramanyan Chandrasekhar em 1942. Outra possibilidade levantada seria a de uma colisão entre um buraco negro e uma estrela de nêutrons, mas aí o problema seria o inverso: o buraco negro teria de ser excepcionalmente pequeno e aí entra a explicação mais exótica: a colisão entre dois buracos negros primordiais.
Buracos negros primordiais são previstos para terem se formado nos primeiros momentos depois do Big Bang, antes mesmo do universo completar 1 segundo de idade. Esse tipo de buraco negro poderia ter um limite bem amplo de massas, mas apenas os que têm mais de 100 milhões de toneladas teriam sobrevivido à radiação de Hawking. Abaixo desse limite, os buracos negros já teriam se evaporado. Se essa teoria estiver correta, os buracos negros primordiais mais comuns no universo teriam por volta de 1 massa solar, mais ou menos o esperado para os elementos desse evento. Entretanto os próprios cientistas do projeto não acreditam muito nessa ideia e acham mais provável que os modelos disponíveis precisam ser melhorados.
Falando em cientistas, a colaboração envolve por volta de 530 pela parte do Virgo e 1.300 pelo lado do LIGO. Nesse segundo grupo estão alguns pesquisadores brasileiros divididos em duas equipes. Uma, encabeçada por Odylio Aguiar está baseada no INPE em São José dos Campos (SP) e tem atualmente 5 pesquisadores. Já a outra equipe tem 2 pesquisadores chefiados por Riccardo Sturani da UFRN em Natal (RN).
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