Reutilizável, foguete de 150 m seria lançado do mar. Projeto da Corrida Espacial foi abandonado por cortes orçamentários da NASA.
Você já se perguntou como teria sido se a Corrida Espacial não tivesse esfriado após a Apollo XI? Quais teriam sido os próximos passos das potências envolvidas? E onde estaríamos hoje no espaço? Nos anos 60, a NASA tinha planos de levar o homem a Marte duas décadas depois. No final do Século XX, bases permanentes na Lua já não seriam nenhuma novidade.
Como um apaixonado pela Corrida Espacial, fiquei muito feliz com a descoberta a série For All Mankind, que maratonei na virada do ano. A série trabalha com a premissa de que a Corrida Espacial não aconteceu como na realidade. Semanas antes da histórica alunissagem da Apollo XI, a União Soviética fez Alexei Leonov ser o primeiro homem na Lua, com uma frase sobre a forma de vida marxista leninista.
Pois é… Na vida real, os soviéticos não conseguiram acompanhar os Estados Unidos nas viagens à Lua e isso fez com que a Corrida fosse dada como encerrada e não houvesse financiamento suficiente para o programa espacial americano. Na ficção, os EUA são estimulados a expandir suas atividades no espaço pela ação soviética: mulheres são admitidas no programa de astronautas após uma cosmonauta russa plantar uma bandeira na Lua e a NASA assume como principal objetivo uma base lunar permanente após a descoberta de que os soviéticos têm esse plano.
Para quem também gosta do tópico, fica minha recomendação. Especialmente porque faz uma coisa da qual gosto muito: mistura aspectos conhecidos da história real com uma ficção que se encaixa bem para a construção do universo fictício.
(Para minha decepção, Project Blue Book, que maratonei dias antes, falha miseravelmente nesse ponto.)
Pensando no que mais poderia ter sido feito na Corrida Espacial e aproveitanto o post sobre o Projeto A119, um plano de militares americanos de detonar uma bomba atômica na Lua no final dos anos 50 como demonstração de força, procurei sobre algumas ideias que chegaram a ser desenvolvidas mas foram abandonadas. Nessa lista, está o maior foguete já projetado: o Sea Dragon.
Gigante O icônico Saturn V, que lançou as naves Apollo rumo à Lua, é até hoje o foguete mais alto, mais pesado e mais potente já feito. Eram 110,6 m de altura, 10,1 m de diâmetro e quase 3,6 toneladas de empuxo para colocar 2,97 mil toneladas na Órbita Baixa da Terra (low Earth orbit, LEO).
Em algum universo paralelo, ele não ostenta esses títulos. No início dos anos 60, acreditava-se que centenas de pessoas estariam no espaço nas décadas seguintes. Lançadores grandes e com tecnologias relativamente simples reduziriam os custos do envio de material ao espaço.
Assim, em 1962, nasceu a ideia do Sea Dragon, um lançador mais de dez vezes mais potente e com capacidade de carga mais de três vezes maior do que o Saturn V. Seria possível lançar uma estação espacial inteira de uma vez! Ele seria tão grande que o primeiro estágio do Saturn V caberia com folga na exaustão do motor de seu primeiro estágio.
O projeto é de Robert Truax, engenheiro e oficial da Marinha dos EUA de 1939 a 59. Ele foi um dos pioneiros no desenvolvimento de foguetes no país, trabalhou com mísseis Polaris, Thor e outros, e projetou o Sea Dragon enquanto estava na Aerojet (1959-66). Sua equipe foi formada a partir de engenheiros e cientistas alemães levados aos EUA pela Operação Clipe de Papel – incluindo Werner Von Braun, que depois projetou o Saturn V.
Para Truax, o custo dos foguetes vinha de sua complexidade, não de seu tamanho. Por isso, apesar de gigantesco, o Sea Dragon era de conceitos relativamente simples. Hoje, o conceito de lançadores pesados de baixos custo e complexidade é chamado de big dumb booster.
Um bom exemplo de simplicidade está nos motores. No lugar de bombas acionadas por turbinas para mover o combustível e o comburente, como no Saturn V, Truax propôs tanques de nitrogênio líquido para pressurizar os tanques de combustível e comburente. Essa pressão os levaria à câmara de combustão.
Isso reduziria o custo de fabricação, aumentaria a confiabilidade e facilitaria a manutenção para reutilização. (É isso mesmo: um foguete reutilizável nos anos 60!) Não seria tão eficiente quanto o Saturn V, mas o tamanho tornaria o custo por massa lançada bem mais barato.
Seriam 150 m de altura e 23 m de diâmetro. Para reduzir a altura, a parte superior do primeiro estágio estaria contida dentro da exaustão do segundo. Para manter o custo baixo, seriam usados materiais comuns, como alumínio, uma liga naval de aço e níquel e aço inoxidável.
Submerso O lançamento do Sea Dragon, com mais de 36 mil toneladas de empuxo no primeiro estágio, destruiria qualquer plataforma. O ruído era estimado em 165 dB a 8 km. A pluma da exaustão teria mais de 1,6 km. É aí que entendemos seu nome: com tanta violência, esse foguete só poderia ser lançado do mar. Não de uma embarcação, como o Sea Launch, mas direto da água.
Parece loucura, mas nem tanto. O mar tem suas vantagens como plataforma de lançamento: é indestrutível, não requer muitos sistemas de apoio, portanto, é barato, tem boa absorção de ruído e a densidade da água ajuda a manter a orientação do foguete nos primeiros momentos.
Mas a água não apaga as chamas? Lembre-se: o foguete tem seu próprio suprimento de oxigênio. (Por isso funciona no espaço.) E o empuxo empurra a água para longe da exaustão.
Em 2002, foi proposto um serviço de lançamento de baixo custo chamado Aquarius. Tinha proporções relativamente pequenas, mas poderia entregar cargas à Estação Espacial Internacional, por exemplo. A Marinha dos EUA também pesquisou lançamentos espaciais no mar e descobriu que o estresse no lançador era menor do que em lançamentos convencionais. Falaremos sobre isso mais adiante.
Construção A ideia era construir o Sea Dragon na água, o que tem seus próprios desafios. A água salgada é corrosiva e condutora elétrica. É tão perigosa para veículos espaciais que a NASA investiu US$ 1,65 milhões no início dos anos 60 – cerca de US$ 2,1 bi nos valores de hoje – desenvolvendo um sistema de asas do tipo paraglider para se afastar de amerrissagens.
A Aerojet se inspirou em submarinos, veículos militares complexos com componentes delicados que sobrevivem imersos na água salgada por meses. Segundo a proposta, era uma questão de proteção adequada. Todos componentes elétricos seriam instalados em uma membrana à prova d’água com acesso apenas por regiões do foguete acima da linha da água. Toda a fiação externa seria contida em conduítes pressurizados com gás nitrogênio seco. Uma vez abastecido com oxigênio líquido, um isolamento fornecia proteção contra formação de gelo.
Como no caso de submarinos, peças grandes, como os principais componentes dos estágios seriam construídos em estaleiros e docas secas. Componentes menores seriam fabricados externamente. Todas as peças seriam montadas por dragas em uma lagoa em uma instalação próxima de Cabo Canaveral.
Após a montagem do foguete em si, seria adicionado um elemento chave: a unidade de lastro. Seria composta por seis tanques cilíndricos, estruturas de suporte e uma abertura na parte superior para encaixe na exaustão do Sea Dragon. Além do lastro, também forneceria um ambiente mais controlado para a combustão submersa e minimizaria as chances do motor balançar com cargas laterais do ambiente. Antes do lançamento, a unidade manteria o foguete firme para constrição e, em conjunto com flutuadores e cabos de ancoragem, cada peça do foguete poderia ser bem controlada enquanto estivesse acoplada horizontalmente.
Apesar de estar na água, a preparação seria semelhante à de um foguete comum. Após o sinal positivo da checagem pré-abastecimento, o foguete seria abastecido a partir de unidades de armazenamento próximas.
O primeiro estágio, medindo 79,8 m, seria propelido por querosene RP-1 e oxigênio líquido (LOX) na proporção de 2,3:1. O nitrogênio líquido empurraria o RP-1 a 32 atm e o LOX a 17 atm pelo único motor do estágio. A pressão total no lançamento seria de 20 atm e cairia conforme a ascensão do veículo.
O segundo, com 83,8m, usaria hidrogênio e oxigênio moleculares na forma líquida (LH2 e LOX) na proporção de 5:1, escolhida por sua alta performance com custo razoável por massa. Até houve a ideia de usar um porta-aviões nuclear para fazer a eletrólise da água para obter H2 e O2 para o foguete. Também teria um motor único e grande, com 5,8 mil toneladas de empuxo, alimentado por pressão – nesse caso, constante em 7 atm. Para melhorar a performance, a exaustão desse motor seria expansível, mudando de 7:1 para 27:1 conforme a ascensão.
O segundo estágio também contaria com quatro motores de LOX e LH2 pivotados ao redor de um único eixo com controle eletrônico. Além do empuxo extra, serviriam para direcionar o foguete e controlar sua rolagem.
Conforme a checagem final, os tanques poderiam ser complementados. LOX evapora à taxa de 1% ou 2% por dia e LH2 a 5% por dia.
Sobre o segundo estágio, haveria um interestágio e o compartimento de carga.
Isso daria ao Sea Dragon a capacidade de levar 550 toneladas para a LEO e uma massa de decolagem de 18 mil toneladas. Cada lançamento custaria US$ 300 mil (valor de 1962). O custo por massa lançada seria de um quarto o do Saturn V.
Mar Pode parecer arriscado abastecer o foguete antes de transportá-lo pelo mar por 65 km, mas haveria um bom motivo. As ondas do mar poderiam causar estresse na célula do foguete. Os tanques de ambos os estágios tinham paredes grossas que, junto à pressurização de cerca de 30 psi, fornecia apoio estrutural.
Ainda haveria estresse por ondas levantando ambos os limites do foguete ao mesmo tempo e por ondas levantando apenas o meio do veículo. Ter o foguete abastecido também diminuiria o estresse sofrido por ele por causa disso.
Uma vez no local de lançamento, a unidade de lastro seria preenchida lentamente com fluído para reduzir sua flutuabilidade. Totalmente cheia, pesaria cerca de 4,5 mil toneladas e traria o foguete para a posição vertical. Essa manobra representaria o maior estresse para o foguete – não a agitação do mar. A pressão interna dos tanques e do interestágio ajudariam a manter o Sea Dragon rígido, mas ainda haveria o risco das ondas casarem com a agitação do veículo. O foguete estaria seguro com ondas abaixo de 3,65 m (12 pés) e ventos abaixo de 46,3 km/h (25 nós).
Se fosse necessário algum acesso dos técnicos com o foguete já na vertical, haveria trilhos permanentes na lateral do Sea Dragon para um carro de serviço que correria ao longo do veículo. Esse também seria um acesso para tripulantes. (A Aerojet imaginou que voos tripulados eventualmente seriam feitos.) O carro seria removido apenas quando o foguete estivesse totalmente checado e liberado para o lançamento.
A embarcação responsável pelo rebocamento do foguete gerenciaria as operações de lançamento junto com Cabo Canaveral. O sistema de orientação inercial do foguete seria alinhado usando uma instalação Loran (para radionavegação) na costa. Depois disso, a plataforma alinhável do Sea Dragon manteria sua orientação estável. Com tudo em ordem, o Cabo daria a ordem e a embarcação executaria o lançamento.
Ascenção Os motores auxiliares do segundo estágio seriam os primeiros na ordem de acionamento. Depois, seria o motor do primeiro estágio. O lançamento submerso penalizaria o empuxo nos primeiros momentos. O sistema de controle poderia lidar com qualquer dispersão quando emergia, segundos depois do acionamento do primeiro estágio.
A pressão externa na base do foguete e em seu motor seria muito maior do que qualquer foguete convencional. No momento da ignição, o primeiro motor do Sea Dragon estaria sob 150 psi – enquanto foguetes ao nível do mar estão sob cerca de 5 psi. Sem falar que o oceano fornece menos apoio do que a plataforma rígida de concreto e braços de segurança. Outra vez, os tanques pressurizados de RP-1 e LOX ajudariam com a pressão externa da densidade da água, assim como a pressão na câmara de combustão, se acionada sem estar inundada.
A partir daí, o lançamento seria bem convencional. A 85 m/s (90 km/h), o foguete começaria a se inclinar, abaixando o nariz até 7 graus. Manteria essa orientação até o final da queima do primeiro estágio. A queima se encerraria após 81 segundos de voo, com 14 atm na câmara de combustão, com o Sea Dragon passando por aceleração de até 4,2 g. O veículo estaria a 38 km de altitude (125 mil pés), com downrange (a distância horizontal do foguete ao local de lançamento) de até 32 km e velocidade de 1,7 km/s (6,3 mil km/h).
O primeiro estágio seria cortado e iniciaria-se a separação entre estágios, também auxiliada por pressão, que duraria 3 segundos – rápido o bastante para que não houvesse contato algum após a separação ou perturbação da trajetória. Além de conter os elementos para facilitar a separação, o interestágio de alumínio reforçado transmitiria a carga entre os estágios. Como o segundo estágio seria acionado quase imediatamente após o corte do primeiro, haveria pouquíssima perda de velocidade.
O motor do segundo estágio, com a ajuda dos quatro auxiliares, queimava por mais 260 segundos. Ao final dessa fase, o foguete estaria a 278 km (cerca de 911,5 mil pés) de altura, downrange de 940 km, e velocidade de 5,4 km/s (19,3 mil km/h).
Daí em diante, seria com os motores auxiliares. Eles ainda queimariam por mais 22,4 minutos. Apesar do pouco empuxo, seria o suficiente para levar a altitude a 555,6 km e ajustar a trajetória para reduzir a excentricidade. Em downrange, a injeção orbital ocorreria a cerca de 7,6 mil do local de lançamento e cerca de 1.340 segundos após o Sea Dragon deixar a água. Quando todos os motores desligassem, a carga estaria em uma bela órbita circular.
Apesar de ter sido projetado para missões tripuladas e não tripuladas, a carga básica foi imaginada como um tanque de alumínio contendo mais de 450 toneladas de LH2 para reabastecimento orbital. Módulos de comando e serviço ao estilo Apollo forneceriam orientação, controle e comunicações entre a carga e o Cabo, mas poderia ser ainda mais simples. Se a missão fosse apenas levar o tanque de LH2 para a órbita, um veículo como uma Mercury ou uma Gemini poderiam servir como cápsula de comando, dando o apoio adequado à aproximação e à acoplagem para uma transferência de combustível.
Reutilizável Ao contrário dos foguetes Atlas da época, o Sea Dragon foi projetado para ser quase todo reutilizável, com a recuperação de suas partes começando já durante o lançamento.
Imediatamente após o lançamento, a unidade de lastro afundaria. Uma vez que as bolsas internas de flutuação fossem infladas remotamente, ela retornaria à superfície. Então, seria levada de volta para a lagoa para sua próxima missão.
No corte do primeiro estágio, as válvulas seriam fechadas, mantendo cerca de 100 psi no tanque de LOX e 290 psi no de RP-1. Ele seguiria subindo até 102 km (335 mil pés) antes de retornar ao oceano. A Aerojet estudou algumas opções para reduzir a velocidade do impacto.
Paraquedas? Não. Para evitar a destruição do estágio no contato com o oceano, um paraquedas teria que ter 822 m de diâmetro com um drogue de 13 m abrindo entre Mach 1.8 e 2. As chances de falha na abertura eram muito grandes. Também descartaram adicionar uma seção alargada na base do foguete para que o arrasto reduzisse a velocidade porque, enquanto solução passiva, o peso era muito grande.
A solução encontrada foi um desacelerador aerodinâmico inflável, um sistema simples e de alta confiabilidade. Seria uma faixa inflável cônica com 31 m de diâmetro e um meio ângulo de 55 graus. Além disso, uma faixa toroidal de 9,1 m de diâmetro seria mantida rígida com tubos infláveis de 3 m de diâmetro. A montagem seria feita com tecido nylo-dacron emborrachado com revestimento de tecido de asbestos ablativos emborrachados que poderiam ser queimados, sacrificados para proteção térmica até cerca de 540 °C. A pressurização da faixa, 30 psi, seria feita com metano armazenado em tanques no estágio. Isso também garantiria que o estágio cairia na orientação correta.
Com tudo isso, o primeiro estágio sobreviveria à reentrada. Passaria por 6,5 g e teria uma velocidade de impacto de 91 m/s (327,6 km/h), a 314 km downrange do ponto de lançamento. Uma vez de volta ao mar, o estágio seria ventilado até uma pressão estável e segura. A faixa seria parcialmente despressurizada e o estágio seria levado de volta para a lagoa para ser preparado para outro round.
O segundo estágio teria pequenos retrofoguetes no nariz para retornar da órbita. Após reentrar na atmosfera, uma faixa parecida com a do primeiro estágio faria a desaceleração até 64 m/s (230 km/s). A pressão de 50 psi nos tanques protegeria o estágio no impacto. Também seria rebocado para a lagoa para preparação para outra missão.
A nave de controle – Apollo, Mercury ou Gemini – poderia retornar para a Terra, claro, como faziam normalmente.
Uma vez na lagoa, uma triagem determinaria o que seria necessário substituir. Trabalhos nos tanques seriam feitos com os estágios flutuando na lagoa. Válvulas de acionamento único, pintura, isolamento, material ablativo e toda a estrutura do interestágio teria que ser substituída para cada voo.
Por fim, tudo seria montado na lagoa, como antes. Com alto nível de reutilização , a Aerojet imaginou que cada estágio poderia voar 10 vezes – talvez até 100.
Testes Para provar na prática os conceitos do Sea Dragon, foram criados foguetes menores. Em 1961, antes de seu projeto, um foguete Aerobee excedente foi modificado para que pudesse ser acionado na água – o Seabee. Ele funcionou bem na primeira vez em modo limitado, em 25 de outubro daquele ano. Testes posteriores incluíram várias abordagens para preparar a unidade para repetidos acionamentos. Para a surpresa da equipe, isso mostrou-se tão simples que o custo da reutilização foi de cerca de 7% o de uma unidade nova. O último teste foi em 2 de novembro.
A segunda fase demonstrou o conceito em escala maior e com sistemas de orientação. Truax obteve 39 mísseis Corporal sobressalentes do Exército dos EUA. Um deles foi transformado no Sea Horse. Com 31 m de altura e 3 m de diâmetro, o foguete de dois estágios tinha capacidade de carga de 2 toneladas e massa de lançamento de 55 toneladas. Eram 67,5 toneladas de empuxo. Alcançava o apogeu de 185 km. Os combustíveis eram os mesmos do Sea Dragon.
O foguete alimentado por pressão foi testado em uma balsa na Baía de São Francisco, em Tiburon. Primeiro, o motor foi acionado a poucos metros da água. Depois, foi progressivamente abaixado até uma profundidade considerável. Não ocorreram problemas com o acionamento submerso e houve uma atenuação de ruído substancial.
A operação era semelhante à do Sea Dragon: o míssil era levado ao local de lançamento, compartimentos ligados a ele eram enchidos com água para que o míssil ficasse na vertical e o veículo era lançado.
Para manter esse programa, a Aerojet tentou um acordo com a Marinha para obter uma instalação parada em Tiburon. Tudo por um modesto financiamento independente de pesquisa e desenvolvimento.
Além do papel? O projeto do Sea Dragon foi revisado pela Todd Shipyards, que concluiu que tinha a capacidade necessária e que não seria muito diferente de construir um casco de submarino. Seria usado aço maraging de 8 mm. A NASA encaminhou o projeto para a TRW para avaliação, que confirmou os custos e a engenharia da Aerojet.
A Aerojet considerou comprar Sudden Ranch para construir o foguete. A propriedade inclui vários quilômetros de costa entre Santa Barbara e a Base da Força Aérea Vandenberg, na Califórnia. Esse era o único lugar na região continental dos EUA que poderia lançar diretamente a uma órbita polar sem sobrevoar áreas populadas. Posteriormente, o local foi incorporado à Base. A Base fora construída ao custo de US$ 117 milhões, na época. Em valores atuais, cerca de US$ 924 mi. A lagoa teria custo equivalente.
Quando o relatório de três volumes sobre o fogeute foi publicado, em 1963, a Aerojet previu que os sistemas poderiam estar operacionais em pouco mais de cinco anos e meio (68 meses) pelo custo total de US$ 2,8 bi, US$ 22,4 bi atuais. Apesar de parecer caro à primeira vista, seria mais eficiente. Com 240 voos esperados, o custo total por kg posto em órbita ficaria entre US$ 20 e US$ 65. Tudo foi projetado com esse objetivo. No caso do sistema inflável para recuperação, a penalidade no peso era de apenas 2% da habilidade de carga. Mesmo o lançamento no mar não causava tanta penalidade à carga: apenas 3,2% em comparação a um lançamento convencional. Pouquíssimo, levando em conta que o fogeute poderia ser reutilizado.
Os únicos custos associados à reutilização do primeiro estágio erão os do rebocamento para a lagoa e o recondicionamento, menos do que os US$ 24 mi necessários para construir um novo. No caso do primeiro estágio ser expendido, a nova configuração do Sea Dragon poderia levar mais 13,6 toneladas para a órbita.
Infelizmente, isso aconteceu justamente quando a NASA estava sofrendo cortes orçamentários e o conflito no Vietnam consumia cada vez mais dinheiro do governo americano. A NASA dissolveu o Ramo de Projetos Futuros (FPB), acabando com quase todo o trabalho ligado a missões tripuladas a Marte. Também acabou com a esperança do Sea Dragon, uma vez que a Aerojet não poderia mais financiá-lo.
Chama a atenção o fato de que o conteito do Sea Dragon foi desenvolvido após apenas algumas pessoas terem ido ao espaço. Nenhuma parte do foguete foi considerada tão complexa ou grande que uma solução não poderia ser desenvolvida. Era sim um monstro. Mas era um monstro que poderiam trazer à luz.
Em 1992, a Truax Engineering, fundada por Robert Truax em 1966, propôs o Excalibur, ligeiramente maior que o Saturn V: 120 m de altura e 10,7 m de diâmetro. Motores alimentados por pressão, primeiro estágio com LOX e querosene a 24 atm na câmara de combustão e segundo estágio com LOX e LH2 com 5 atm na câmara – muito semelhante ao Sea Dragon. A orientação era feita por uma combinação de sistema inercial e GPS. Com 55 toneladas de carga, a massa de lançamento seria de 2,3 mil toneladas. Alcançaria o apogeu de 230 km.
Como prova de conceito, o Excalibur S, projetado em 1998, colocou 500 kg em órbita com apogeu de 185 km. Seus dois estágios eram recuperáveis.
A Truax Engineering teve outro projeto de lançamento a partir do mar nos anos 90. O SEALAR (SEA LAunched Rocket, “foguete lançado do mar”) recebeu financiamento do Laboratório de Pesquisa da Marinha e tinha o primeiro lançamento programado para 1996. Um modelo de produção poderia alcançar a órbita por US$ 10 milhões (valor da época). No fim, esse aqui também não chegou à fase de testes e foi cancelado em 1996.
Quanto ao mostruoso Sea Dragon, hoje, é um exercício interessante para muitos genocidas de kerbals. E se não tivesse sido cancelado? Haveria demanda para esse foguete gigante? A ideia só nasceu porque acreditavam que sim.
Os conceitos e a tecnologia são tão válidos hoje quanto nos anos 60. Se um dia tivermos atividades espaciais que tornem o tamanho do Sea Dragon economicamente viável, será que o gigante encontraria seu espaço no céu – e no mar?
Se você se interessa pela Corrida Espacial, recomendo também esta live sobre o tema. É baseada em uma palestra que fiz em 2009. (Caramba, dez anos!) Críticas e sugestões de temas para o BdA são sempre bem-vindas!
Watch the skies!
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