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sábado, 14 de dezembro de 2024

Meteorito encontrado na Terra pode ter novas pistas sobre água e vida em Marte

  A análise de um mineral presente em um meteorito marciano que caiu na Terra revelou vestígios de água em Marte que datam de 4,45 bilhões de anos atrás, segundo uma nova pesquisa. O grão de zircão pode conter a evidência direta mais antiga de água quente no planeta vermelho, o que significa que é possível que já tenham existido em Marte ambientes como fontes termais, associadas ao surgimento da vida na Terra.

A descoberta abre novos caminhos para entender se Marte já foi habitável em seu passado antigo. Também adiciona mais suporte às observações já coletadas pela frota de naves espaciais orbitando e explorando o planeta vermelho, que detectaram evidências de onde rios e lagos existiram na superfície marciana.  No entanto, questões-chave permanecem, como quando exatamente a água apareceu em Marte e como ela evoluiu – e desapareceu – ao longo do tempo. 

Cientistas analisaram uma amostra do meteorito "Beleza Negra" ("Black Beauty", em inglês), também conhecido como NWA 7034, encontrado no Deserto do Saara em 2011. O meteorito foi ejetado da superfície marciana após outro objeto celeste atingir o planeta entre 5 milhões e 10 milhões de anos atrás, e seus fragmentos têm servido como fonte fundamental para estudar o Marte antigo por anos. O novo estudo, publicado na revista Science Advances em 22 de novembro, focou em um único grão do mineral zircão encontrado dentro do meteorito.

A análise da equipe mostra que a água estava presente apenas 100 milhões de anos após a formação do planeta, o que sugere que Marte pode ter sido capaz de sustentar vida em algum momento de sua história.

"Nossos dados sugerem a presença de água na crosta de Marte em um período comparável às primeiras evidências de água na superfície da Terra, cerca de 4,4 bilhões de anos atrás", disse o autor principal do estudo, Jack Gillespie, pesquisador da Faculdade de Geociências e Meio Ambiente da Universidade de Lausanne, na Suíça, em um comunicado.

"Esta descoberta fornece novas evidências para compreender a evolução planetária de Marte, os processos que ocorreram nele e seu potencial para ter abrigado vida", acrescentou ele. Minerais como cápsulas do tempo As rochas podem conter as respostas para algumas das maiores questões remanescentes sobre Marte, incluindo quanta água estava presente e se a vida já existiu no planeta. É por isso que meteoritos como o Beleza Negra são de tanto interesse para os cientistas.

Carl Agee, professor e diretor do Instituto de Meteorítica da Universidade do Novo México, apresentou pela primeira vez a rocha espacial à comunidade científica em 2013. "[O meteorito Beleza Negra] contém centenas de fragmentos de rochas e minerais, cada um com uma parte diferente dos 4,5 bilhões de anos da história marciana", disse o coautor do estudo Dr. Aaron Cavosie, cientista planetário e professor sênior do Centro de Ciência e Tecnologia Espacial da Universidade Curtin, por e-mail.

 "Ele é a única fonte de peças para o quebra-cabeça geológico do Marte pré-Noachiano." O período Noachiano ocorreu de 4,1 a 3,7 bilhões de anos atrás, e pouco se sabe a partir de medições diretas datando do período pré-Noachiano em Marte, entre 4,5 bilhões e 4,1 bilhões de anos atrás, embora seja crucial entender porque ele serve como a primeira página no livro da história de Marte, disse Cavosie. 

Mas o Beleza Negra revelou alguns de seus segredos. Muitos dos fragmentos de rocha que o meteorito contém mostram que a crosta marciana suportou vários impactos, causando uma quantidade massiva de agitação na superfície do planeta, ele disse. A rocha espacial também contém as peças mais antigas conhecidas de Marte, incluindo os zircões mais antigos, disse Cavosie.

O zircão, usado em produtos como joias, azulejos cerâmicos e implantes médicos, é um mineral resistente que pode ajudar os cientistas a olhar para o passado e determinar as condições presentes quando cristalizou, incluindo a temperatura na época e se o mineral interagiu com água. "O zircão contém traços de urânio, um elemento que atua como um relógio natural", disse Gillespie, que era pesquisador de pós-doutorado na Escola de Ciências da Terra e Planetárias da Universidade Curtin na época do estudo.

"Este elemento se decompõe em chumbo ao longo do tempo a uma taxa precisamente conhecida. Ao comparar a proporção de urânio com chumbo, podemos calcular a idade da formação do cristal." O zircão encontrado no Beleza Negra não foi alterado por sua viagem à Terra nem por sua entrada ardente na atmosfera do nosso planeta antes de cair no Saara, pois estava protegido por sua localização no interior do meteorito, explicou Cavosie. 

Durante a análise do grão de zircão, a equipe de estudo detectou quantidades incomuns de ferro, sódio e alumínio, sugerindo que fluidos ricos em água deixaram esses traços no zircão quando ele se formou há 4,45 bilhões de anos.

Tais elementos geralmente não são encontrados em zircão cristalino, mas os estudos em escala atômica dos pesquisadores mostraram que os elementos foram incorporados à estrutura cristalina e alinhados como barracas de frutas em um mercado, disse Cavosie.

"Pudemos perceber pelos padrões de como [o ferro, alumínio e sódio] são encontrados dentro do zircão que eles foram incorporados ao grão conforme ele crescia, como camadas em uma cebola", explicou ele. Na Terra, zircões de sistemas hidrotermais — que se formam quando a água é aquecida por atividade vulcânica subsuperficial, como o fluxo ascendente de magma quente — têm padrões semelhantes aos encontrados no Beleza Negra.

Se sistemas hidrotermais existiam na crosta marciana há 4,45 bilhões de anos, é provável que água líquida tenha chegado à superfície. "Nossa experiência na Terra mostra que a água é essencial para habitats capazes de sustentar vida", disse Cavosie.

"Muitos ambientes na Terra hospedam vida em sistemas de água quente, incluindo fontes termais e respiradouros hidrotermais. Tais ambientes podem ter dado origem às primeiras formas de vida na Terra. Nosso novo estudo mostra que a crosta de Marte estava quente e úmida no período pré-Noachiano, significando que ambientes habitáveis podem ter existido naquela época.

" Conhecendo Marte um pouco melhor Cavosie está curioso para determinar se sistemas hidrotermais como fontes termais eram prevalentes quando o magma estava ajudando a formar a crosta do planeta vermelho entre 4,48 bilhões e 4,43 bilhões de anos atrás ou se eram mais pontuais.

"Se os sistemas hidrotermais eram uma característica estável no início de Marte, isso indicaria que condições habitáveis podem ter persistido por um período considerável", disse Cavosie.

"Esta é agora uma hipótese testável que pode ser abordada coletando mais dados de zircões marcianos." Até que amostras possam ser retornadas diretamente de Marte, o meteorito Beleza Negra é uma das melhores janelas para entender como a crosta marciana se formou e como era a superfície inicial de Marte, disse Briony Horgan, co-investigadora da missão do rover Perseverance e professora de ciência planetária na Universidade Purdue em West Lafayette, Indiana. Horgan não participou deste estudo.

Encontrar evidências de sistemas hidrotermais no subsolo a partir de um minúsculo grão de zircão alinha-se com teorias científicas sobre a quantidade de água e atividade vulcânica que existia em Marte antigo, ela disse.

E esses primeiros ambientes potencialmente habitáveis teriam sido protegidos da radiação por um forte campo magnético planetário, que Marte não possui hoje, acrescentou Horgan. Os cientistas ainda estão tentando explicar como o planeta vermelho perdeu seu campo magnético protetor. Atualmente, o rover Perseverance está subindo a borda da Cratera Jezero em Marte, um antigo lago que já foi preenchido com água há 3,7 bilhões de anos.

Algumas das rochas que o rover encontrou podem ter sido formadas por sistemas hidrotermais, disse Horgan. O rover coletará amostras das rochas porque elas podem preservar evidências de antiga vida microbiana.

"Por mais que os meteoritos possam nos dizer, podemos fazer ainda melhor com uma amostra de rocha cuidadosamente selecionada e intacta de um local conhecido em Marte com bom contexto geológico", disse Horgan. "Então este artigo é uma ótima motivação para trazer nossas amostras de Marte de volta à Terra para estudar com o mesmo nível de detalhe nos próximos anos."

CNN BRASIL

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