O surgimento do universo é, sem dúvida, uma das questões mais fascinantes da humanidade. Não faltam hipóteses, debates acalorados e até mesmo boas doses de humor sobre o que realmente aconteceu antes do bang inicial. Mas será que precisamos de um Criador para explicar o Big Bang?
Cientistas como Alex Filippenko, Lawrence Krauss e outros pesos pesados da física desafiam a visão tradicional, propondo que as próprias leis naturais podem ser as arquitetas do cosmos. Vamos mergulhar nessa discussão onde ciência e filosofia se entrelaçam.
Quem precisa de um criador quando se tem física quântica?
No universo peculiar da física quântica, a realidade parece mais com um show de mágica do que com o mundo sólido que conhecemos. Segundo Filippenko, da Universidade da Califórnia, as leis naturais são suficientes para explicar o Big Bang. Ele sugere que o próprio vazio quântico, uma espécie de “caldeirão caótico” onde partículas aparecem e desaparecem aleatoriamente, pode ser a resposta para a questão que muitos atribuem a Deus.
Seth Shostak, do Instituto SETI, eleva a ousadia um degrau ao afirmar que, em teoria, seria possível criar um novo universo em laboratório apenas “torcendo” o espaço e o tempo adequadamente. Claro, isso ainda está no campo da especulação, mas a ideia é clara: se partículas podem surgir do nada no microcosmo quântico, por que não o próprio universo?
Deus ou física? Ou ambos?
Embora muitos achem que a ciência possa ter aposentado Deus, Filippenko discorda. Para ele, a ciência não é capaz de provar nem a existência nem a ausência de um criador. Afinal, se as leis da física deram origem ao cosmos, de onde surgiram essas leis? Se apelarmos para Deus como a origem delas, não estaríamos apenas empurrando a pergunta para mais longe? Por outro lado um Deus que criou apenas as leias da física e deixou o universo de desenvolver naturalmete a partir dali não é uma explicação satisfatória.
Krauss, em seu livro Um universo que veio do nada, acrescenta que o “nada” do qual o universo surgiu pode ser tão instável que foi inevitável que algo emergisse. A física quântica, com suas partículas virtuais que entram e saem da existência em espaços vazios, torna esse cenário mais plausível do que parece à primeira vista. Para ele, o conceito de “nada” é menos filosófico e mais físico: o vazio pode ser cheio de energia potencial.
O universo é só um “saldo zero”?
Stephen Hawking, no livro O Grande Projeto (The Grand Design), coautorado com Leonard Mlodinow, argumenta que o universo poderia ter surgido do “nada” devido às leis da física, em especial a gravidade. Segundo ele, a presença da gravidade torna inevitável a criação espontânea do universo, eliminando a necessidade de uma causa divina ou de uma condição pré-existente. Essa ideia é baseada em conceitos da física quântica, como as flutuações de vácuo, onde partículas e antipartículas surgem e se anulam espontaneamente em espaços vazios.
Hawking também reforça que o universo não exige um “projeto” divino, mas pode ser explicado por fenômenos naturais e matemáticos. O argumento gerou discussões intensas em torno do papel das leis da física na origem do cosmos e sua capacidade de explicar a existência do universo sem recorrer a explicações teológicas ou sobrenaturais.
Essa perspectiva se conecta a debates mais amplos sobre cosmologia, como os apresentados por Quentin Smith no artigo “The Reason the Universe Exists Is That It Caused Itself to Exist”, onde ele explora explicações autossuficientes para a existência do universo no contexto da cosmologia ateísta.
Mas, se isso soa como uma desculpa conveniente, Krauss rebate que é mais plausível do que invocar um criador sobrenatural. Para ele, entender como as coisas funcionam não diminui a beleza do universo; pelo contrário, torna-o ainda mais fascinante.
Existe algo mais que o Big Bang?
Outra possibilidade levantada por Krauss é a de que nosso universo seja apenas um entre muitos. O conceito de “multiverso” propõe uma sequência infinita de Big Bangs, cada um gerando universos com diferentes características. Alguns colapsam rapidamente, enquanto outros, como o nosso, duram bilhões de anos, tempo suficiente para formar estrelas, galáxias e a vida como a conhecemos. A ideia de que ganhamos “na loteria cósmica” pode parecer aleatória demais para alguns, mas é um modelo que está alinhado com as teorias atuais.
E quando tudo terminar?
Se o universo surgiu do nada, é possível que ele retorne ao nada. Krauss prevê que, em um futuro extremamente distante, a expansão cósmica levará as galáxias para tão longe umas das outras que o cosmos voltará a ser um vazio uniforme. Nesse cenário, os “positivos” e “negativos” de energia irão se cancelar, e o universo acabará como começou: no nada.
Embora essa visão possa soar pessimista, Krauss e seus colegas veem nela algo extraordinário. Afinal, tudo o que existe hoje — incluindo você lendo este texto — é fruto de um breve intervalo de ordem em um mar de caos.
Reflexões finais: somos parte de um grande acaso?
Para Krauss, a ciência oferece uma narrativa sobre as origens que pode ser até mais inspiradora do que as histórias religiosas. Não há nada deprimente, ele defende, em sermos resultado de um acidente cósmico. Pelo contrário, isso deve nos encher de admiração pela sorte fantástica de estarmos aqui, conscientes, apreciando o espetáculo do universo. É um grande privilégio e astronomicamente quase impossível — de inúmeras maneiras distintas — de ter ocorrido.
Vejo nesse debate não uma divisão entre ciência e religião, mas um convite à curiosidade. Se a ciência nos permite desvendar os segredos do cosmos, ela também nos lembra de que as respostas finais ainda são escassas. Como Filippenko afirmou, não cabe à ciência provar ou refutar a existência de Deus, mas isso não a impede de explorar as perguntas mais profundas da existência.
Hypescience.com
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