Não há dúvida de que os premiados com o Nobel em Física deste ano mudaram para sempre nossa forma de ver o cosmos e nosso lugar nele. James Peebles é um dos principais artífices do chamado modelo cosmológico padrão, que fez do estudo do nascimento e da evolução do Universo uma ciência exata, e duvido que alguém em sua área vá contestar a escolha. Contudo, no campo dos exoplanetas, há pelo menos um pesquisador que não deve estar nada feliz com a decisão do comitê: Alex Wolczcan.
Uma busca no Google há de revelar que foi ele, ao lado de Dale Frail, o responsável pela descoberta dos primeiros exoplanetas confirmados de qualquer tipo, em 1992. Eles orbitavam um pulsar, o cadáver de uma estrela de alta massa.
O achado foi permeado de controvérsia. Primeiro porque ninguém esperava achar planeta ao redor do que restou da explosão de uma supernova, lançando muitas dúvidas iniciais sobre o achado. Depois, uma vez que a comunidade astronômica ficou convencida de que esses objetos existiam mesmo, pelo fato de eles serem mais uma peculiaridade cósmica do que uma resposta a uma dúvida ancestral.
Desde pelo menos o filósofo Giordano Bruno, no século 16, a humanidade vivia a especulação pendular sobre a natureza dos planetas: seriam eles uma ocorrência singular, incomum, acidental, ou, em vez disso, o subproduto natural do nascimento de estrelas?
A pendularidade perdurou por todo o século 20, que foi marcado, em sua primeira metade, pela popularização da teoria segundo a qual apenas em circunstâncias muito raras e especiais, quando estrelas passavam de raspão umas pelas outras, planetas se formavam, seguida por uma série de detecções que se provaram falsos positivos nos anos 1960 e 1970. Isso deixou marcas na comunidade astronômica.
Quando Michel Mayor e seu estudante de doutorado Didier Queloz decidiram se prestar à busca por planetas fora do Sistema Solar, o estigma em torno desse esforço era tão grande que era preferível mencionar o objeto de estudo por eufemismos como “companheiros subestelares”.
Eles desenvolveram a técnica capaz de fazer as primeiras detecções em 1995, deram fim a séculos de especulações, encontrando o primeiro exoplaneta a orbitar ao redor de uma estrela similar ao Sol: o gigante gasoso 51 Pegasi b.
Diferentemente da estratégia usada por Wolczcan e Frail (que envolvia observações radiotelescópicas e medição precisa do período do pulsar, algo naturalmente só aplicável a esse tipo de astro), o método aplicado por Mayor e Queloz podia sondar, em princípio, qualquer tipo de estrela. E apenas uma semana depois uma dupla americana, Geoff Marcy e Paul Butler, confirmou o achado de forma independente. Iniciava-se ali uma revolução astronômica – ainda em curso – capaz de pôr fim a séculos de especulação.
Em 2009, fui um dos responsáveis pela edição do jornal que circulava diariamente na Assembleia Geral da União Astronômica Internacional, realizada no Rio de Janeiro. Após publicarmos um artigo que destacava o pioneirismo de Mayor e Queloz no contexto do estudo dos exoplanetas, um astrônomo do Observatório de Arecibo visitou a redação pedindo uma retratação que mencionasse a descoberta de Wolczcan e Frail (feita, claro, em Arecibo). Exasperado, ele dizia: “Estamos falando de um potencial Prêmio Nobel!”
Ele estava certo. Nós também.
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