Ao contrário de Júpiter e Saturno, os planetas gasosos Urano e Netuno – os mais distantes do nosso sistema solar – não têm muito destaque nos holofotes científicos, mas o fato de eles contarem com literais chuvas de diamantes pode mudar isso. Sim, “chuvas”. De diamantes. Isso é uma consequência de diversos fatores que exercem influência sobre eles, mas, majoritariamente, dois pilares são essenciais para isso ocorrer: “pressão” e “temperatura”, ambas agindo sobre o gelo que permeia os dois planetas mais frios da nossa região.
Antes de tudo, porém, é importante estabelecer o que é o “gelo”: ao contrário do que você imagina, não estamos falando aqui da literal “água sólida” que você tem na forma da sua geladeira. Quando se trata de Urano e Netuno, os dois planetas são feitos, em maior parte, de água, metano e amônia. As moléculas desses três elementos são referidas por astrônomos como “gelo”, embora o único motivo plausível para isso seja o de que, provavelmente, na formação dos planetas, eles estavam todos em forma sólida.
E tem muito destes três sob as densas nuvens dos planetas gasosos distantes. E verdade seja dita, nós não sabemos muito sobre o comportamento desses ambientes: a última vez que uma missão de exploração espacial passou por Urano ou Netuno foi a sonda Voyager 2, lançada em agosto de 1977 (que ainda está ativa, junto de sua predecessora, a Voyager 1). Depois dela, tudo o que sabemos de Urano e Netuno vem de observações telescópicas.
Por isso, cientistas especializados coletam os poucos dados que temos e combinam com experimentos em laboratório, a fim de recriar as condições observadas nos dois planetas. Isso, e (muita) matemática, na forma de modelos estimativos, nos ajuda a preencher as lacunas. E é por isso que podemos afirmar que, lá, está chovendo diamantes.
Urano, Netuno, e a inveja das joalherias
Ironicamente, a primeira menção à “chuva de diamantes” em Urano e Netuno veio da já citada Voyager 2. Basicamente, a ideia é a seguinte: nós sabemos do que os dois planetas são feitos. A física também nos ensina que, quanto mais perto do núcleo de um planeta você chegar, mais alta a temperatura ambiente ficará. Urano e Netuno têm, ambos, núcleos rochosos (provavelmente) rodeados pelos elementos que já citamos – eles formam o “manto” dos dois planetas da mesma forma que ferro, alumínio, magnésio e outros minerais formam o manto da Terra.
Bem, nas camadas mais internas dos dois gigantes gasosos, as temperaturas podem chegar a quase 6,8 mil graus Celsius (6.800 ºC) e pressão seis milhões de vezes maior que a da Terra. Nos lados mais externos, isso diminui: a temperatura fica um pouco abaixo dos 1.800 ºC e a pressão baixa para algo perto de 200 mil vezes a pressão da Terra.
Ainda conosco? Ótimo, porque é nessa variação de pressão que devemos nos concentrar: de uma forma bem resumida, essas mudanças conseguem quebrar as moléculas de metano, fazendo-as liberar carbono. Esse carbono solto vai se juntando e se acumulando, formando longas cadeias que se cristalizam – daí vem os “diamantes”. Esses diamantes então caem pelas camadas do manto de Urano e Netuno, até se tornarem quentes demais, derreterem, evaporarem e subirem, resfriando, cristalizando e “chovendo” de novo – um ciclo interminável.
Evidentemente, essa era a teoria. A melhor forma de validar isso, tirando o envio de uma nave até os dois planetas, foi por meio de experimentos de laboratório que reproduzissem esse efeito usando os mesmos elementos – ou seus melhores equivalentes. Neste caso, o metano é instável demais para ser manipulado desta forma, então cientistas apostam em uma solução que é, em partes iguais, bem mais acessível e bem elegante: poliestireno, um objeto que você conhece muito bem, pois esse é o nome rebuscado do isopor.
Não, não tem isopor em Urano ou em Netuno. Mas segundo os especialistas, quimicamente falando, ele se comporta de forma similar ao metano, sendo bem mais fácil de se manipular e, convenhamos, bem mais fácil de se obter em amplas quantidades.
E foi isso que fizemos: usando poderosos raios laser disparados contra o isopor, nós conseguimos criar “nano diamantes” conforme repetimos a pressão e temperatura vistas nos dois planetas gasosos. Obviamente, nós não criamos o “mini Urano” ou “mini Netuno” – os dois planetas têm pressões e temperaturas mantidas constantemente, ao passo que nossos experimentos reproduzem esses fatores em curtíssimos espaços de tempo – segundos, na melhor das hipóteses.
Por isso, a “chuva de diamantes” deles muito provavelmente envolve pedras mais densas e maiores, ao contrário dos nossos “nano diamantes”. Mas ainda assim, conseguimos comprovar a fiabilidade da teoria, o que nos deixa a um passo mais próximo de entender os dois planetas mais longínquos do nosso sistema solar.
Mas e quanto à exploração dos dois planetas? Bom, isso ainda vai demorar: na última década, 12 missões foram sugeridas e estão, ainda, em fase de avaliação – todas envolvendo sondas a serem posicionadas nas órbitas de cada um deles (Urano: MUSE, Oceanus, ODINUS, Pathfinder, NASA Uranus Orbiter and Probe e Interplanetary Flyby Probe / Netuno: Interplanetary Express, a já citada ODINUS, OSS Mission, Triton Hopper, Trident e Neptune Odyssey).
Todas as missões propostas acima contam com envolvimento da NASA (EUA), ESA (Europa), CNSA (China), além de diversas instituições de educação e pesquisa. Mas seus lançamentos – se eles vierem a se confirmar – devem ficar para depois de 2030 ou 2040.
Fonte: Olhar Digital
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