O telescópio espacial Spitzer, da NASA, contribuiu para a descoberta das anãs marrons (ou anãs castanhas) mais jovens já observadas. Se esta descoberta for confirmada, poderemos resolver o mistério astronômico de como as anãs marrons são formadas.
As anãs marrons objetos proscritos porque se encaixam entre planetas e estrelas, em termos de temperatura intrínseca e sua massa. São objetos mais frios e leves que as estrelas e mais massivas (e normalmente mais quentes) que os planetas. Isto tem gerado debates entre os astrônomos: as anãs marrons se formam como os planetas ou como as estrelas?
As anãs marrons também nascem dentro das mesmas nuvens densas que formam estrelas e planetas. Mas enquanto partilham do mesmo berçário galáctico, as anãs marrons são regularmente apelidadas de estrelas que “falharam” porque não têm tanta massa quanto suas irmãs estelares, mais quentes e brilhantes. Sem essa massa, o gás em seus núcleos não se torna quente o suficiente para ativar o processo de nucleossíntese estelar que processa o hidrogênio (o componente principal destas nuvens moleculares ) gerando o hélio. Incapazes de “acender” como estrelas, as anãs marrons acabam como objetos mais frios que seus irmãos brilhantes. Como objetos pouco luminosos são bem mais difíceis de detectar. Isto, porém, agora é um desafio vencido, neste caso, pela visão infravermelha do Spitzer.
Além disso, há uma complicação adicional: as anãs marrons jovens evoluem rapidamente, o que praticamente impossibilita detectar seu nascimento. A primeira anã marrom foi descoberta em 1995 e, embora desde aí já tenham sido descobertas centenas, os astrônomos não têm sido capazes de descobrí-las em um estágio de formação mais inicial, até agora. Neste estudo, uma equipe internacional de astrônomos descobriu uma candidata denominada “proto-anã-marrom”, ainda cercada pelo seu manto de nuvens moleculares. Os cientistas, guiados por dados recolhidos pelo Spitzer em 2005, focaram a sua pesquisa na nuvem escura Barnard 213, uma região do complexo de Touro-Cocheiro, bem conhecido pelos astrônomos como um “local de caça” de objetos jovens.
“Nós decidimos retroceder vários passos no processo, até quando [as anãs marrons] estão realmente escondidas,” disse David Barrado do Centro de Astrobiologia de Madrid, Espanha, autor principal do artigo, publicado na revista Astronomy & Astrophysics. “Durante esta etapa, teriam uma cobertura opaca, um casulo, e seriam mais fáceis de identificar devido aos seus fortes excessos no infravermelho. Usamos esta propriedade para identificá-las. Aqui é que o Spitzer desempenha um importante papel, pois consegue observar o que se passa dentro destas nuvens. Sem ele o nosso estudo não teria sido possível.”
Esta foto mostra duas anãs marrons recém formadas, objetos que em massa e temperatura intermediárias entre planetas e estrelas. Crédito: NASA/JPL-Caltech/Observatório Calar Alto/Observatório Submilímetro do Caltech
A câmara de infravermelho do Spitzer penetrou no berçário repleto de pó cósmico para observar uma anã marrom bebê, denominada SSTB213 J041757. Os dados foram confirmados pelas observações no infravermelho pelo Observatório de Calar Alto na Espanha. As observações revelaram não uma, mas duas, que potencialmente poderão ser as anãs marrons mais tênues e frias já observadas (mais tênues que as anãs marrons gêmeas do sistema 2M 0939).
Barrado e a sua equipe embarcaram em uma busca internacional por mais informação acerca dos dois objetos. O seu objetivo científico era observar e caracterizar a presença deste poeirento invólucro, uma evidência desta ‘gênese celeste’, indicando se estas anãs marrons estariam realmente em seus estágios evolucionários primordiais.
Assim, as anãs marrons gêmeas foram observadas por diversos observatórios de todo o globo e as suas propriedades foram medidas e analisadas usando as tecnologias de diversas e poderosas ferramentas astronômicas. Um dos locais de passagem dos astrônomos foi o Observatório Submilímetrico de Caltech no Hawaii, EUA, que capturou a presença de uma envoltória de poeira em torno dos jovens objetos. Essa informação, somada a que tinham do Spitzer, permitiu aos astrônomos a construção de uma distribuição energética espectral, ou seja, um diagrama que mostra a distribuição da energia emitida pelos objetos para cada comprimento de onda.
Depois de passar pelo Hawaii, os astrônomos seguiram para outros observatórios na Espanha (Calar Alto), no Chile (VLT) e no Novo México (VLA). Eles também obtiveram dados de 10 anos atrás provenientes dos arquivos do Centro de Dados Astronômicos do Canadá, os quais permitiram medir comparativamente como os dois objetos se moviam no céu. Depois de mais de um ano de estudos e análises, os astrônomos chegaram agora às suas conclusões finais.
“Nós fomos capazes de estimar que este par de objetos consiste na dupla de anãs marrons mais tênues e frias já descobertas”, afirmou Barrado. Barrado disse que esta descoberta possivelmente resolve o mistério se as anãs marrons se formam como estrelas ou como planetas. A resposta? Eles se formam da mesma forma que as estrelas de baixa-massa. Esta idéia é a mais aceita porque a mudança no brilho dos objetos em diversos comprimentos de onda coincide com a das estrelas leves e muito jovens.
Embora os estudos futuros talvez confirmem se estes dois objetos celestes são de fato ‘proto anãs marrons’, nós julgamos que são até agora os melhores candidatos, acrescentou Barrado. Ele lembra que a longa jornada para conseguir esta descoberta, por mais difícil que tenha sido, foi divertida. “É uma história desenrolada peça por peça. As vezes, a natureza leva certo tempo para nos ceder seus segredos.”
Estas observações aconteceram antes do Spitzer esgotar seu líquido refrigerante em Maio de 2009, começando a sua missão “quente”.
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