Simulação de computador do gás quente no enxame galáctico de Perseu.Crédito: John ZuHone/Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica
Combinando dados do Observatório de raios-X Chandra da NASA com observações de rádio e simulações de computador, uma equipe internacional de cientistas descobriu uma vasta onda de gás quente no enxame galáctico de Perseu. Abrangendo cerca de 200.000 anos-luz, a onda tem o dobro do tamanho da nossa própria Via Láctea. Os investigadores dizem que a onda foi formada há milhares de milhões de anos atrás, depois de um pequeno enxame galáctico ter passado pelo enxame de Perseu e ter feito com que o seu vasto reservatório de gás se "agitasse" em torno de um grande volume de espaço.
"Perseu é um dos enxames galácticos mais massivos e próximos e o mais brilhante em raios-X, assim que os dados do Chandra nos fornecem detalhes incomparáveis," comenta o líder científico Stephen Walker, do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland. "A onda que identificámos está associada com a passagem rasante de um enxame mais pequeno, o que mostra que a atividade de fusão, que produziu estas estruturas gigantes, ainda está em andamento. O artigo que descreve os achados está publicado na edição de junho de 2017 da revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society e pode ser consultado online.
Os aglomerados de galáxias são as maiores estruturas ligadas pela gravidade do Universo. Com cerca de 11 milhões de anos-luz de diâmetro e localizado a mais ou menos 240 milhões de anos-luz de distância, o enxame galáctico de Perseu tem o nome da constelação a que pertence. Como todos os enxames de galáxias, a maioria da sua matéria observável toma a forma de um gás penetrante, em média, com dezenas de milhões de graus, tão quente que só brilha em raios-X.
Esta imagem de raios-X do gás quente no enxame de Perseu foi feita a partir de 16 dias de observações do Chandra. Os investigadores então filtraram os dados de modo a aumentar o contraste das bordas a fim de realçar detalhes subtis. A oval salienta a localização de uma enorme onda que se descobriu estar a navegar pelo gás.Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NAS/Stephen Walker et al.
As observações do Chandra revelaram uma variedade de estruturas neste gás, desde bolhas enormes sopradas pelo buraco negro supermassivo na galáxia central do enxame, NGC 1275, a uma enigmática característica côncava conhecida como a "baía. A forma côncava da baía não pode ter sido formada através de bolhas lançadas pelo buraco negro. Observações rádio usando o VLA (Karl G. Jansky Very Large Array), situado no estado norte-americano do Novo México, mostram que a estrutura de baía não produz nenhuma emissão, o oposto do que os cientistas esperariam para características associadas com a atividade do buraco negro. Além disso, os modelos padrão da agitação gasosa normalmente produzem estruturas que arqueiam na direção errada.
Walker e colegas voltaram-se para observações existentes do Chandra a fim de investigar a baía. Combinaram um total de 10,4 dias de dados de alta resolução com 5,8 dias de observações de campo largo a energias entre os 700 e 7000 eV (eletrões-volt). Para comparação, a luz visível tem energias entre os dois e três eletrões-volt. Os cientistas então filtraram os dados do Chandra para realçar as orlas das estruturas e revelar detalhes subtis.
Seguidamente, compararam a imagem aprimorada de Perseu com simulações de computador da fusão de enxames galácticos desenvolvidas por John ZuHone, astrofísico do Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica em Cambridge, Massachusetts, EUA. As simulações foram executadas no supercomputador Pleiades operado pela NASA em Silicon Valley, Califórnia. Embora não estivesse envolvido neste estudo, ZuHone acumulou as suas simulações num catálogo online a fim de ajudar os astrónomos a estudarem aglomerados de galáxias.
Esta animação mostra duas imagens diferentes do gás quente no enxame galáctico de Perseu. A primeira é a melhor imagem do gás quente, pelo Chandra, na região central do enxame, onde os tons vermelho, verde e azul indicam energias mais baixas para energias mais altas, respetivamente. A imagem maior incorpora dados adicionais ao longo de um maior campo de visão. Foi especialmente processada para realçar o contraste das orlas, revelando estruturas subtis no gás.Crédito: NASA/CXC/SAO/E. Bulbul, et al. e Centro de Voo Espacial Goddard da NASA/Stephen Walker et al.
"As fusões de galáxias representam a última fase da formação de estruturas no cosmos," comenta ZuHone. "As simulações hidrodinâmicas da fusão de enxames permitem-nos produzir características no gás quente e ajustar parâmetros físicos como o campo magnético. A partir daí podemos tentar fazer corresponder as detalhadas características da estrutura que observamos em raios-X."
Uma simulação pareceu explicar a formação da baía. Nela, o gás num grande enxame parecido com o de Perseu assentou em dois componentes, uma região central "fria" com temperaturas que rondam os 30 milhões de graus Celsius e uma zona circundante onde o gás é três vezes mais quente. Em seguida, um pequeno enxame galáctico contendo cerca de 1000 vezes a massa da Via Láctea contorna o aglomerado maior, falhando o seu centro por cerca de 650.000 anos-luz.
O voo rasante cria um distúrbio gravitacional que agita o gás como espuma num café, formando uma espiral de gás frio em expansão. Depois de aproximadamente 2,5 mil milhões de anos, quando o gás "subiu" quase 500.000 anos-luz do centro, vastas ondas formam-se e rolam na periferia durante centenas de milhões de anos antes de se dissiparem. Estas ondas são versões gigantes das ondas Kelvin-Hermholtz, que aparecem onde quer que haja uma diferença de velocidade através da interface de dois fluídos, como vento soprando sobre a água. Podem ser encontradas no oceano, em formações de nuvens na Terra e noutros planetas, no plasma perto da Terra e até mesmo no Sol.
"Nós pensamos que a característica em forma de baía que vemos em Perseu faz parte de uma onda Kelvin-Helmholtz, talvez a maior já identificada, que se formou do mesmo modo que a simulação mostra, comenta Walker. "Também identificámos características semelhantes em outros dois enxames galácticos, Centauro e Abell 1795."
Os investigadores também descobriram que o tamanho das ondas corresponde à força do campo magnético do enxame. Se for muito fraco, as ondas atingem tamanhos muitos maiores do que aqueles observados. Se for muito forte, as ondas não se formam. Este estudo permitiu com que os astrónomos estudassem o campo magnético médio ao longo de todo o volume destes enxames, uma medição impossível de obter por qualquer outro meio.
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