Embora tenha sua existência sido prevista em 1905, sendo então chamado de Planeta X, a busca pelo nono planeta do Sistema Solar, o Planeta Nove, só ganhou força na última década, com os astrônomos tentando demonstrar a existência de um objeto massivo orbitando nos confins do Sistema Solar.
Impressão artística do Sistema Solar. [Imagem: NASA/JPL-Caltech]
Embora essa hipótese continue sendo objeto de um amplo debate - longe de um consenso -, o estudo mais recente sobre ela afirma que a ausência do Planeta Nove é estatisticamente impossível.
A NASA vem procurando pelo Planeta X há tempos, mas essa busca mais recente começou em 2012 com a descoberta do planeta anão VP113. Em 2014, dois astrônomos espanhóis estudaram mais a fundo a órbita do VP113 e de outros corpos transnetunianos e, por meio de uma simulação em computador, calcularam que deve existir não apenas um Planeta X, mas também um Planeta Y.
Em 2016, Konstantin Batygin e Michael Brown, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, nos EUA, rodaram outra simulação e chegaram à mesma conclusão, mostrando indícios da influência gravitacional de um Planeta 9 nas órbitas de objetos transnetunianos, ou seja, corpos celestes cujas órbitas cruzam ou estão além da órbita de Netuno.
No entanto, esses resultados tornaram-se objeto de considerável debate, com alguns astrônomos defendendo que os indícios se apoiavam em um número muito pequeno de corpos celestes transnetunianos, e cuja seleção poderia apresentar um viés. Em um artigo publicado em abril passado, os pesquisadores então voltaram sua atenção para uma classe de objetos que são, a priori, menos sujeitos a um viés observacional, e chegaram à mesma conclusão: Que suas órbitas só podem ser explicadas se estiverem sob a influência de um planeta ainda desconhecido.
Agora eles foram além, mas para saber como é necessário entender como tudo começou.
As órbitas de seis objetos transnetunianos (em roxo). Em laranja, a órbita hipotética do misterioso Planeta 9. O ponto brilhante no centro da imagem é o Sol. [Imagem: Caltech/R. Hurt(IPAC)]
Como surgiu a hipótese do Planeta 9?
Vários rastreios astronômicos realizados ao longo de várias décadas, durante o século XX e o início do século XXI, mostraram que as órbitas de cerca de dez objetos transnetunianos parecem estar alinhadas. "Todos eles têm a mesma orientação no céu, então sua distribuição não é aleatória," explica Sean Raymond, da Universidade de Bordeaux, na França.
No entanto, as leis da mecânica celeste sugerem que esse não deveria ser o caso: Quando um objeto viaja ao redor do Sol, o eixo de sua órbita também oscila, traçando um caminho ao redor da nossa estrela, um fenômeno conhecido como precessão. "Então, mesmo que, há mais de 4 bilhões de anos, vários objetos tenham sido ejetados na mesma direção devido a perturbações no início do Sistema Solar, suas órbitas deveriam ter divergido desde então por causa dessas precessões," detalha Alessandro Morbidelli, que também participou da nova análise.
O fato de as órbitas terem permanecido alinhadas todo esse tempo é um sinal de que há "algo" forçando-as a se comportar de forma diferente do que seria esperado. "Como os objetos estão muito longe de Netuno, a influência gravitacional do planeta não pode estar forçando suas órbitas a permanecerem agrupadas. A única explicação para essa anomalia é que deve haver outro planeta," explica o astrônomo.
Foi assim que surgiu a hipótese de um planeta ainda não descoberto no Sistema Solar, com os cálculos indicando que ele teria uma massa de cinco a sete vezes maior que a da Terra e se moveria em uma órbita distante, elíptica e inclinada.
Esquerda: Vista de cima para baixo das órbitas de vários objetos transnetunianos com vieses observacionais bem estabelecidos. O círculo pontilhado azul mostra a órbita de Netuno, enquanto a estrela no centro é o Sol. À direita, os números adjacentes aos pontos indicam a inclinação orbital de cada objeto, em graus. [Imagem: Konstantin Batygin et al 2024 ApJL 966 L8]
Certeza estatística
As várias questões antepostas à hipótese do Planeta Nove incluem uma dúvida fundamental: Como podemos ter certeza de que as órbitas daqueles objetos transnetunianos realmente estão alinhadas? E, mesmo que estejam, o número desses corpos observados até agora é limitado: Apenas dez ou pouco mais podem não ser suficientes para serem estatisticamente confiáveis. Além disso, os objetos foram descobertos por muitos astrônomos diferentes, usando uma ampla gama de pesquisas astronômicas - como podemos ter certeza de que todos os vieses subjacentes a essas observações foram modelados corretamente?
Batygin e seus colegas então se voltaram para uma nova abordagem: Em vez de se concentrar em objetos distantes que, por terem órbitas altamente elípticas e nunca se aproximarem de Netuno, são muito difíceis de observar, eles agora mudaram seu foco para uma classe de objetos transnetunianos que cruzam a órbita de Netuno. "Esses objetos passam relativamente perto de nós e são brilhantes, o que os torna mais fáceis de estudar. Alguns deles já são conhecidos por nós e seus vieses observacionais são mais diretos de modelar," disse Morbidelli.
Mas há mais um detalhe: Esses objetos são altamente instáveis. Conforme cruzam as órbitas de planetas gigantes, a trajetória de corpos tão pequenos são alteradas, o que faz com que eles tenham uma vida curta, de apenas algumas dezenas de milhões de anos. Essa população, portanto, não é a mesma, sendo continuamente reabastecida por novos indivíduos oriundos da população de objetos transnetunianos verdadeiros.
"Nós comparamos um sistema com um Planeta 9 e um sistema sem ele para descobrir a que taxa essa população de objetos que cruzam Netuno pode ser renovada," descreve Morbidelli. "E descobrimos que, sem o Planeta 9, essa taxa é muito baixa, com objetos insuficientes cruzando a órbita de Netuno. Com o Planeta 9, por outro lado, nossos modelos reproduzem as observações muito melhor."
Em outras palavras, este novo estudo, a priori menos tendencioso do que os anteriores, também conclui claramente que há um planeta ainda não descoberto, sendo estatisticamente impossível descrever os dados observacionais se ele não estiver presente.
Espaço não falta para o Planeta Nove. E é justamente isso o que torna difícil visualizá-lo. [Imagem: NASA/JPL-Caltech]
Certeza mesmo só quando o fotografarmos
Então, essa certeza estatística confirma a existência de um nono planeta no Sistema Solar? Não é bem assim que os cientistas trabalham. "Você nunca deve acreditar que algo existe até que você realmente o encontre. Você tem que procurar por isso com a mente aberta," disse Raymond.
Mas será um golpe de sorte muito grande se alguém apontar um telescópio para o ponto exato onde se encontra o Planeta Nove num determinado momento. Para achá-lo, primeiro os astrônomos terão que fazer cálculos corretos e precisos de sua órbita, para que então comecemos a procurar por ele e possamos vê-lo.
E, para melhorar nossos cálculos, será necessário fazer rastreios direcionados para os objetos transnetunianos que servem de base para esses cálculos, para eliminar os vieses e incertezas. A expectativa é que o Telescópio Vera Rubin, que está sendo construído no Chile, contando com a maior câmera astronômica do mundo, ajude nessa busca.
"A vantagem do Vera Rubin é que ele observará mais da metade do céu a cada dois ou três dias, com uma profundidade que certamente é tão boa quanto a do Observatório Espacial Hubble," detalhou Raymond. "Ele foi projetado especificamente para encontrar objetos escuros se movendo pelo céu, como o Planeta 9. Não é 100% certo que o telescópio irá detectá-lo mesmo que ele ex ista, mas se ele não o localizar, será difícil continuar acreditando que o planeta está lá."
Fonte: Inovação Tecnológica
Nenhum comentário:
Postar um comentário