Quando os buracos negros engolem grandes quantidades de matéria do espaço circundante, eles não são muito sutis. Eles arrotam enormes quantidades de raios-X, gerados pela matéria que chega a temperaturas intensas à medida que é sugada em direção ao buraco negro; os raios são tão brilhantes que podemos detectá-los da Terra.
Esse é um comportamento normal para um buraco negro. O que não é normal é que esses sinalizadores de raios-X emitam com regularidade cronometrada, um comportamento intrigante relatado em 2019 a partir de um buraco negro supermassivo no centro de uma galáxia a 250 milhões de anos-luz de distância. A cada nove horas, boom – uma explosão de raios X.
Após um estudo cuidadoso, o astrônomo Andrew King, da Universidade de Leicester, no Reino Unido, identificou uma causa potencial: uma estrela morta que sobreviveu ao seu encontro com um buraco negro, presa em uma órbita elíptica de nove horas ao seu redor. A cada passagem próxima, no apoastro, o buraco negro capta mais material da estrela.
“Esta anã branca está presa em uma órbita elíptica perto do buraco negro, orbitando a cada nove horas”, explicou King em abril de 2020.
“Em sua aproximação mais próxima, cerca de 15 vezes o raio do horizonte de eventos do buraco negro, o gás é puxado da estrela para o disco de acreção ao redor do buraco negro, liberando raios-X.”
O buraco negro é o núcleo de uma galáxia chamada GSN 069, e é bem leve para um buraco negro supermassivo; apenas 400 mik vezes a massa do Sol. Mesmo assim, é ativo, cercado por um disco quente de material de acreção, que o alimenta o o faz crescer.
De acordo com o modelo de King, este buraco negro estava ali, de boas, quando uma estrela gigante vermelha — o estágio evolutivo final de uma estrela semelhante ao Sol — começou a chegar um pouco perto demais.
O buraco negro prontamente chupou as camadas externas da estrela, acelerando sua evolução para uma anã branca, o núcleo morto que resta uma vez que a estrela esgotou seu combustível nuclear (anãs brancas brilham com calor residual, não os processos de fusão de estrelas vivas).
Mas ao invés de continuar sua jornada, a anã branca foi capturada em órbita ao redor do buraco negro, e continuou a alimentá-lo.
Baseado na magnitude dos raios-X, e nossa compreensão dos flashes que são produzidos pela transferência de massa do buraco negro, e da órbita da estrela, King foi capaz de restringir a massa da estrela, também. Ele calculou que a anã branca é cerca de 0,21 vezes a massa do Sol.
Na extremidade mais leve da escala, essa é uma massa padrão para uma anã branca. E se assumirmos que a estrela é uma anã branca, também podemos inferir — com base em nossa compreensão de outras anãs brancas e evolução estelar — que a estrela é rica em hélio, tendo há muito tempo ficado sem hidrogênio.
“É notável pensar que a órbita, massa e composição de uma pequena estrela a 250 milhões de anos-luz de distância poderiam ser inferidas”, disse King.
Com base nesses parâmetros, ele também previu que a órbita da estrela oscila ligeiramente, como um pião que, ao girar, perde velocidade. Esta oscilação deve se repetir a cada dois dias ou mais, e podemos até ser capazes de detectá-la, se observarmos o sistema por tempo suficiente.
Este pode ser um mecanismo pelo qual os buracos negros crescem com o tempo. Mas precisamos estudar mais tais sistemas para confirmar, e eles não são fáceis de detectar.
Por um lado, o buraco negro da GSN 069 é de menor massa, o que significa que a estrela pode viajar em uma órbita mais próxima. Para sobreviver a um buraco negro mais massivo, uma estrela teria que estar em uma órbita muito maior, o que significa que qualquer periodicidade na alimentação seria difícil de enxergar. E se a estrela chegar muito perto, o buraco negro a destruiria.
Mas o fato de um ter sido identificado oferece esperança de que não seja o único sistema desse tipo por aí.
“Em termos astronômicos, este evento só é visível para nossos telescópios atuais por um curto período de tempo, cerca de dois mil anos, então, a menos que tenhamos muita sorte de ter visto este, pode haver muitos outros que estamos perdendo em outros lugares do Universo”, disse King.
Quanto ao futuro da estrela, bem, se nada mais mudar, a estrela ficará exatamente onde está, orbitando o buraco negro, e continuando a ser lentamente descamada por bilhões de anos. Isso fará que ela cresça em tamanho e reduza em densidade — as anãs brancas são apenas um pouco maiores que a Terra — até chegar a uma massa planetária e talvez se transformando em um planeta gigante gasoso como Júpiter.
“Ele vai se esforçar muito para fugir, mas não há como escapar”, disse King. “O buraco negro vai comê-lo cada vez mais lentamente, mas nunca vai parar.”
A pesquisa foi publicada Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
Fonte: Hypescience.com
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