Um estudo publicado na revista Astronomy & Astrophysics revela a descoberta de dois novos sistemas planetários orbitando estrelas semelhantes ao nosso Sol, também conhecidas como análogas solares.
O estudo foi liderado pelo Dr. Eder Martioli, investigador titular do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA/MCTI, Brasil) e investigador associado do IAP (Institut d'astrophysique de Paris), e pelo Dr. Guillaume Hébrard, investigador do IAP.
Ilustração artística do sistema planetário TOI-1736, com representações não à escala dos exoplanetas TOI-1736 c (esquerda) e TOI-1736 b (centro). Crédito: Leandro de Almeida
As observações responsáveis pela deteção destes dois sistemas, denominados TOI-1736 e TOI-2141, foram realizadas com o telescópio espacial TESS da NASA e com o espectrógrafo SOPHIE instalado no telescópio de 1,93 metros do OHP (Observatoire de Haute-Provence) no sul da França. Sistemas planetários como estes não apenas ampliam o nosso conhecimento sobre a formação e evolução de planetas em torno de estrelas semelhantes ao Sol, mas também possibilitam medições mais precisas das propriedades físicas dos planetas, aproveitando a semelhança entre a estrela hospedeira e o nosso Sol.
Os exoplanetas
A descoberta do primeiro exoplaneta, 51 Pegasi b, em 1995, realizada com o mesmo telescópio de 1,93 m no OHP e que resultou no Prémio Nobel da Física para os astrónomos Michel Mayor e Didier Queloz, marcou o início de uma revolução na nossa compreensão sobre a existência de sistemas planetários no Universo. Hoje, mais de 5500 exoplanetas são conhecidos, e essa contagem cresce diariamente. A descoberta desses objetos oferece uma oportunidade para estudar a presença de planetas em torno das estrelas e a variedade de características físicas que podem ser encontradas em diferentes sistemas.
Uma das lições aprendidas desde a descoberta do primeiro exoplaneta é que o Sistema Solar não é único e não abarca todos os tipos de planetas possíveis. Por exemplo, o planeta 51 Pegasi b é do tamanho de Júpiter, mas orbita bem mais próximo da sua estrela do que qualquer outro planeta no Sistema Solar, por isso é chamado de "Júpiter quente".
Outros tipos de planetas comuns em sistemas exoplanetários são as super-Terras e os mini-Neptunos, ambos sem equivalentes no nosso Sistema Solar. Outra descoberta importante é que a diversidade de tipos estelares, seja grande ou pequena, quente ou fria, não impede a formação de planetas.
No entanto, o tipo de estrela pode influenciar na frequência de certos tipos de planetas. O trabalho desenvolvido pela equipa do Dr. Eder Martioli teve como objetivo principal estudar duas estrelas muito semelhantes ao Sol, nas quais foram detetados planetas do tipo mini-Neptuno e super-Júpiter, ambos sem similares no Sistema Solar. Isso permitiu uma compreensão mais aprofundada da presença de planetas com diferentes características e de como esses corpos evoluem num ambiente semelhante ao do nosso Sol.
O sistema planetário TOI-2141
O primeiro sistema desta descoberta, TOI-2141, consiste de uma estrela situada a 250 anos-luz de distância, com um tamanho praticamente idêntico e uma idade ligeiramente mais avançada que a do nosso Sol. A sua composição química também revela uma escassez de elementos mais pesados em comparação com o Sol. A quantidade de elementos mais pesados é um importante factor para o processo de formação planetária.
O planeta TOI-2141 b foi detetado através do método de trânsito, no qual o planeta passa em frente à estrela, gerando pequenos eclipses periódicos que permitem a sua deteção pela monitorização das variações no brilho estelar. Esse planeta possui um diâmetro três vezes maior que o da Terra e uma massa cerca de 24 vezes maior que a da Terra, sendo classificado como um mini-Neptuno. Completa uma órbita em torno da estrela a cada 18,26 dias, mantendo-se a uma distância de apenas 13% da distância entre a Terra e o Sol.
Devido à sua proximidade à estrela, estima-se que o planeta possua uma temperatura de cerca de 450 graus Celsius. A sua densidade sugere a presença de um núcleo rochoso e uma atmosfera com uma grande quantidade de vapor de água, porém, apenas na forma gasosa devido às altas temperaturas. Não foram identificados outros planetas neste sistema, mas a possibilidade de encontrar outros planetas menores ainda não pode ser descartada devido às limitações dos métodos de observação.
O sistema planetário TOI-1736
O segundo sistema desta descoberta, TOI-1736, revelou-se um tanto exótico. A estrela principal está a uma distância de 290 anos-luz e é muito similar ao Sol, principalmente em termos de temperatura e idade, sendo apenas cerca de 15% maior que o Sol e com uma concentração ligeiramente maior de elementos químicos mais pesados.
Observou-se que o sistema TOI-1736 possui uma estrela companheira, menor e mais fria, caracterizando-se, portanto, como um sistema estelar binário. No entanto, a estrela mais fria está distante o suficiente para não interferir no sistema planetário, que orbita apenas em torno da estrela principal, semelhante ao Sol. Foram detetados pelo menos dois planetas neste sistema.
O primeiro, TOI-1736 b, também é um mini-Neptuno, com um diâmetro 2,5 vezes maior que o da Terra e uma massa 13 vezes superior à da Terra. Apresenta trânsitos e orbita a uma distância da estrela correspondente a apenas 7% da distância entre a Terra e o Sol, completando uma órbita a cada 7,1 dias. Devido a essa proximidade, o planeta recebe significativamente mais radiação da estrela, resultando numa temperatura estimada de 800 graus Celsius.
O segundo planeta, TOI-1736 c, não apresenta trânsitos, porém possui uma massa 2800 vezes maior que a da Terra, quase 9 vezes maior que Júpiter - o maior planeta do Sistema Solar. Com esse tamanho, TOI-1736 c é classificado como um super-Júpiter e por pouco não se tornou uma estrela. Ele completa uma órbita a cada 570 dias. Localizado a apenas 30% a mais de distância do que a Terra está do Sol, este planeta encontra-se na chamada zona habitável da estrela TOI-1736.
Essa zona é definida como a região ao redor da estrela com temperatura adequada para permitir a existência de água líquida na superfície do planeta. TOI-1736 c é provavelmente um gigante gasoso, similar a Júpiter, portanto, não se espera que tenha uma superfície sólida como a da Terra. No entanto, se por acaso o planeta TOI-1736 c abrigar uma lua, esse corpo sólido poderia ter uma atmosfera, potencialmente permitindo a presença de água líquida e, quem sabe, ser um mundo habitável.
As observações de TOI-1736 revelaram indícios de um possível terceiro planeta em órbita mais distante, necessitando de monitorização por um período prolongado para a sua confirmação. Assim, a equipa continua a observar TOI-1736 com o espectrógrafo SOPHIE no OHP, na esperança de, em breve, obter mais informações sobre essa estrela tão semelhante ao Sol, mas com um sistema planetário tão diverso.
Fonte: Astronomia OnLine
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