A formação planetária ainda é um mistério. Os astrónomos estudam discos protoplanetários há décadas, tentando resolver os detalhes da génese planetária. Graças ao ALMA, uma equipa de cientistas, pela primeira vez, "escavou" fundo nas estruturas espirais do enorme disco protoplanetário de Elias 2-27, uma estrela jovem a 378 anos-luz de distância na direção da constelação de Ofiúco. A equipa de investigação pensa que as instabilidades gravitacionais são a origem das espirais, e não a interação com um planeta ou estrela companheira. Os resultados deste estudo foram publicados na revista The Astrophysical Journal.
Discos de gás e poeira rodeiam estrelas jovens recém-formadas. São chamados de discos protoplanetários, e os astrónomos esperam que os planetas se desenvolvam aí nos primeiros 10 milhões de anos de vida das estrelas.
"Exatamente como é que os planetas se formam é uma das principais questões no nosso campo. No entanto, existem alguns mecanismos-chave que pensamos impulsionar o processo," explica Teresa Paneque Carreño, ex-estudante de Astronomia na Universidade do Chile que agora está a fazer o seu doutoramento no ESO em Garching, Alemanha, investigadora principal deste estudo. "Um destes mecanismos são as instabilidades gravitacionais, um processo que ocorre quando o disco é massivo o suficiente para que a sua gravidade se torne relevante na forma como as partículas interagem entre elas." As instabilidades gravitacionais podem fazer com que o disco se fragmente em pequenos aglomerados, que podem tornar-se em planetas gigantes muito rapidamente.
As características únicas de Elias 2-27 tornaram-na popular entre os cientistas do ALMA por mais de meia década. Uma equipa liderada por Laura Perez da Universidade do Chile e coautora desta nova investigação descobriu, também usando o ALMA, as espirais no disco de Elias 2-27 em 2016. Mas não foram capazes de determinar o que gerou as instabilidades gravitacionais. Foram necessárias outras observações em várias bandas do ALMA e rastreadores de gás para explorar a estrutura das espirais tanto em gás como em poeira.
"Descobrimos em 2016 que o disco de Elias 2-27 tinha uma estrutura diferente de outros sistemas já estudados. Algo não observado num disco protoplanetário antes: dois braços espirais de grande escala. A origem destas estruturas permaneceu um mistério, por isso precisávamos de mais observações," explica Perez. "E assim, em conjunto com colaboradores, propusemos ao ALMA a exploração simultânea tanto da emissão de gás como da emissão da poeira neste sistema. Este novo estudo tornou-se o foco da tese de mestrado de Teresa na Universidade do Chile."
Cassandra Hall, professora assistente de Astrofísica Computacional na Universidade de Georgia e coautora da investigadora, acrescentou que a confirmação da assimetria vertical e das perturbações de velocidade - as primeiras perturbações em grande escala ligadas à estrutura espiral num disco protoplanetário - podiam ter implicações significativas para a teoria da formação planetária. "Isto podia ser uma 'arma fumegante' da instabilidade gravitacional, que pode acelerar alguns dos primeiros estágios da formação planetária. Previmos esta assinatura pela primeira vez em 2020 e, do ponto de vista da astrofísica computacional, é excitante estamos certos."
Paneque-Carreño acrescentou que, embora a nova investigação tenha confirmado algumas teorias, também levantou mais questões. "Embora as instabilidades gravitacionais possam agora ser confirmadas para explicar as estruturas espirais no contínuo de poeira em torno da estrela, há também uma divisão interna, ou material ausente no disco, para o qual não temos uma explicação clara."
"As imagens de alta resolução angular obtidas com o ALMA em vários comprimentos de onda foram fundamentais para estudar a morfologia do disco e as propriedades da poeira," explica John Carpenter, cientista do Observatório ALMA e coautor desta investigação. "A localização espacial das partículas de diferentes tamanhos permite-nos entender os processos de crescimento da poeira e inferir a origem da morfologia espiral."
Além disso, a alta sensibilidade do ALMA permitiu à equipa estudar as perturbações cinemáticas e os processos dinâmicos rastreados pela emissão molecular. Usando duas moléculas como rastreadores (13CO e C18O), descobriram que o disco estava altamente perturbado e rodeado por emissões de gás em grande escala produzidas por material além da extensão do disco principal de poeira e gás.
"Ficámos surpresos ao encontrar perturbações verticais no gás do disco. Isto não tinha sido observado antes neste tipo de fonte," diz Paneque Carreño. "As perturbações são grandes demais para serem explicadas por uma companheira. A estrutura vertical assimétrica do disco está provavelmente relacionada com a queda contínua de material, mostrando como os locais de formação planetária são caóticos."
Uma das barreiras para entender a formação planetária era a falta de medições diretas da massa dos discos formadores de planetas, um problema abordado na nova investigação. A alta sensibilidade do ALMA permitiu à equipa estudar mais de perto os processos dinâmicos, a densidade e até mesmo a massa do disco. "As anteriores medições da massa de discos protoplanetários eram indiretas, baseadas apenas na poeira e ou em isotopólogos raros.
Com este novo estudo, somos agora sensíveis a toda a massa do disco," disse Benedetta Veronesi - estudante da Universidade de Milão e investigadora pós-doutorada na ENS (École Normale Supérieure) de Lyon, autora principal de um segundo artigo. "Este achado é a base para o desenvolvimento de um método para medir a massa do disco que nos permitirá quebrar uma das maiores e mais insistentes barreiras no campo da formação planetária. O conhecimento da massa presente nos discos de formação de planetas permite-nos determinar a quantidade de material disponível para a formação dos sistemas planetários e melhor entender o processo pelo qual se formam."
Embora a equipa tenha respondido a muitas perguntas críticas sobre o papel da instabilidade gravitacional e da massa do disco na formação planetária, o trabalho ainda não terminou. "O estudo de como os planetas se formam é difícil porque demoram milhões de anos a formar-se. Esta é uma escala de tempo muito curta para estrelas, que vivem milhares de milhões de anos, mas um longo processo para nós," disse Paneque-Carreño.
"O que podemos fazer é observar estrelas jovens, com discos de gás e poeira ao seu redor, e tentar explicar porque é que os discos de material têm o aspeto que têm. É como olhar para a cena de um crime e tentar adivinhar o que aconteceu. A nossa análise observacional, emparelhada com futuras análises aprofundadas de Elias 2-27, permitirá caracterizar exatamente como as instabilidades gravitacionais atuam nos discos formadores de planetas e obter mais informações sobre como os planetas são formados."
Fonte: ccvalg.pt/astronomia
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