Astrónomos capturaram as primeiras medições da rotação de HR 8799, o famoso sistema que fez história como o primeiro sistema exoplanetário a ser fotografado.
Descoberto em 2008 por dois observatórios no Hawaii - o Observatório W. M. Keck e o Observatório Gemini, um programa do NOIRLab da NSF - o sistema estelar HR 8799 está localizado a 129 anos-luz de distância e tem quatro planetas mais massivos que Júpiter, ou super-Júpiteres - os planetas HR 8799 b, c, d e e. Nenhum dos seus períodos de rotação tinha sido medido, até agora. A descoberta foi possível graças a uma equipa de ciência e de engenharia do Caltech e do Observatório Keck que desenvolveu um instrumento capaz de observar exoplanetas conhecidos e já fotografados a resoluções espectrais detalhadas o suficiente para permitir que os astrónomos decifrem a velocidade com que os planetas giram.
Usando o KPIC (Keck Planet Imager and Characterizer) de última geração no telescópio Keck II no topo do Maunakea, Hawaii, os astrónomos descobriram que as velocidades mínimas de rotação dos planetas HR 8799 d e e eram de 10,1 km/s e 15 km/s, respetivamente. Isto traduz-se numa duração do dia que pode ser tão curta quanto três horas ou tão longa quanto 24 horas, como a Terra, dependendo das inclinações axiais dos planetas HR 8799, que atualmente são indeterminadas. Para contextualizar, um dia em Júpiter dura quase 10 horas; a sua velocidade de rotação é de cerca de 12,7 km/s.
Quanto à rotação dos outros dois planetas, a equipa foi capaz de restringir a rotação de HR 8799 c a um limite superior de menos de 14 km/s; a medição da rotação do planeta b foi inconclusiva. As descobertas são os primeiros resultados científicos do KPIC, que foram aceites para publicação na revista The Astronomical Journal; o estudo está disponível em formato pré-impresso no site arXiv.org.
"Com o KPIC, fomos capazes de obter as observações de resolução espectral mais alta já realizadas dos exoplanetas HR 8799," diz Jason Wang, astrónomo do Caltech e autor principal do estudo. "Isto permite-nos estudá-los com granularidade mais fina do que nunca e dá-nos a chave para obter uma compreensão mais profunda não apenas de como estes quatro planetas se formaram, mas de como os gigantes gasosos em geral se desenvolvem por todo o Universo."
Dados vertiginosos desvendam o passado dos planetas
A rapidez com que um planeta gira dá uma ideia da sua história de formação. Criados a partir de gás e poeira levantados por uma estrela recém-nascida, os planetas bebés começam a girar mais depressa à medida que acumulam mais material e crescem - um processo chamado de acreção de núcleo. Pensa-se que os campos magnéticos planetários diminuem e limitam a sua velocidade de rotação. Depois do planeta totalmente formado terminar a sua acreção e arrefecer, volta a girar mais depressa.
"As rotações dos planetas HR 8799 d e e são consistentes com a teoria de que os campos magnéticos dos planetas travam as suas rotações nos seus anos natais," diz Wang. "As medições de rotação também sugerem a noção de que planetas de massa inferior giram mais depressa porque são menos afetados pela travagem magnética, o que nos pode dizer algo importante sobre como se formam. Acho isso tantalizante."
Esta animação de HR 8799, criada em 2017, inclui sete imagens diretas capturadas pelo Observatório W. M. Keck ao longo de um período de sete anos. Mostra o movimento orbital dos quatro planetas no sistema. Crédito: J. Wang/C. Marois, NRC-HIAWang enfatiza que esta possível tendência não foi confirmada; para validá-la são necessárias mais medições de rotação, pelo KPIC, de companheiros de massa inferior. O objetivo da equipa é encontrar uma ligação entre os períodos de rotação dos planetas HR 8799, os planetas gigantes no nosso próprio Sistema Solar, Júpiter e Saturno, e outros super-Júpiteres e anãs castanhas conhecidas.
"Com medições suficientes, seremos capazes de identificar tendências que revelariam como os processos físicos que conduzem a formação planetária funcionam," diz o coautor Jean-Baptiste Ruffio, investigador no Caltech. "Isto é algo que as pessoas já começaram a fazer, mas o KPIC permite-nos fazê-lo para os mundos alienígenas mais pequenos, fracos e mais próximos já fotografados."
O primeiro sucesso do KPIC
Comissionado entre 2018 e 2020, a especialidade do KPIC é detetar exoplanetas e anãs castanhas que orbitam tão perto das suas estrelas hospedeiras que o brilho estelar torna difícil "ver" estes corpos celestes da Terra. O instrumento filtra a indesejada luz das estrelas por meio de uma unidade inovadora de injeção de fibra que direciona a luz do sistema de óticas adaptativas do telescópio Keck II para o NIRSPEC (Near-Infrared Spectrograph) do Observatório.
Os primeiros resultados do KPIC estão descritos num artigo técnico que foi aceite para publicação na revista JATIS (Journal of Astronomical Telescopes, Instruments, and Systems) e está disponível em formato pré-impresso no site arXiv.org. O KPIC é um avanço no campo da caracterização exoplanetária," diz Dimitri Mawet, investigador principal do KPIC, professor de astronomia no Caltech. "Permite-nos medir a duração do dia de um planeta, a órbita e a composição molecular da sua atmosfera."
O KPIC fez fortes deteções de água e monóxido de carbono, mas nenhum metano, em três dos quatro planetas HR 8799 - c, d e e - o que é consistente com o que é conhecido das atmosferas dos planetas.
"É empolgante ver a manifestação dos superpoderes do KPIC," diz Jacques Delorme, cientista/engenheiro do sistema de óticas adaptativas do Observatório Keck, autor principal do artigo na JATIS. "Por ser a primeira tecnologia do seu género, não sabíamos se o KPIC funcionaria tão bem. Agora que demonstrámos com sucesso as suas capacidades, podemos passar para a Fase 2 do projeto e melhorar ainda mais o desempenho geral do instrumento."
"Ainda temos que desvendar todo o potencial científico do KPIC," diz Nemanja Jovanovic do Caltech, coautor do artigo técnico. "Por meio de mais atualizações do instrumento, esperamos observar exoplanetas num futuro próximo com um tão alto grau de detalhe, que seremos capazes de estudar fenómenos climáticos e mapear nuvens de planetas gigantes gasosos."
A Fase 2 das atualizações do KPIC está planeada para este inverno. Se tudo correr bem, a comunidade científica do Observatório Keck pode começar a usar a tecnologia na segunda metade de 2022.
Fonte: Astronomia OnLine
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