Existem muitas ideias estranhas na ciência. Mas a teoria dos buracos negros – os objetos tão massivos e compactos que nada, nem mesmo a luz pode escapar – com certeza encabeça a lista de muitas pessoas.
Embora a evidência para esses objetos seja convincente, ela não é 100% conclusiva. Assim, no campo em se é céptico por natureza, alguns astrônomos ainda estão trabalhando para provar que os buracos negros não são apenas fruto da imaginação dos teóricos. Quando se trata de algo “tão extraordinário, temos que trabalhar pesado antes de estarmos dispostos a aceitar-los”, disse Ramesh Narayan do Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics. Essa é a dicotomia cuidadosamente equilibrada de idéias selvagens e a suspeita obstinada que permite que a ciência fique perambulando lentamente em direção à verdade. Agora, uma equipe de cientistas, incluindo Avery Broderick do Perimeter Institute for Theoretical Physics, do Canadá, Narayan, e outros, encontrou mais evidências sobre a existência desses elusivos objetos. A equipe espiou no coração da M87, uma galáxia elíptica que tem um buraco negro supermassivo com massa 6 bilhões de vezes maior que a massa do Sol. Ali, os astrônomos viram evidências indiretas para o horizonte de eventos do monstro: o ponto sem retorno, que delimita o próprio buraco negro.
A equipe usou três rádio telescópios na Califórnia, no Arizona e no Havaí para fazer as observações, que fazem parte de um projeto ainda em desenvolvimento de um Telescópio de Horizonte de Eventos. O objetivo foi distinguir se esse objeto realmente tem um horizonte de evento, que é característico de somente um buraco negro, ou se ele na verdade tem uma superfície. À medida que o material flui para dentro de qualquer objeto massivo, ele é aquecido e emite correntes de fótons de alta energia. Assim, o gás ao redor do objeto massivo deve ser extremamente brilhante. Mas existirá uma diferença notável no brilho dependendo se o objeto tem uma superfície ou um horizonte de eventos.
“Se existir uma superfície, então o material que cai, irá respingar na superfície”, disse o co-autor do estudo John Kormendy, da Universidade do Texas em Austin. E esse respingo fará com que o material brilhe mais quente e mais intensamente. Mas se não existir uma superfície – como no caso de um horizonte de eventos – então da nossa perspectiva, o material eventualmente desaparecerá e consequentemente não poderá manter seu brilho. Assim, um objeto com um horizonte de eventos deve aparecer mais escuro do que um objeto de mesma massa com uma superfície.
Com essa premissa, os próximos passos são relativamente diretos, mas longe de serem simples. Primeiro, a equipe mediu a quantidade de material que cai na direção do buraco negro supermassivo da M87. Em segundo lugar, a equipe calculou o brilho esperado para um objeto com uma superfície. Esse número forneceu como resultado algo aproximadamente 100 bilhões de vezes mais brilhante que o Sol. Em terceiro lugar, a equipe checou para ver se suas observações se ajustavam ao brilho esperado. Se sim, então o objeto tinha uma superfície, caso as observações não confirmassem as previsões muito provavelmente o objeto tinha um horizonte de eventos.
A equipe descobriu então que o objeto aparecia mais escuro do que se esperava (no mínimo com uma ordem de grandeza em magnitude) para um objeto com uma superfície. “Assim, nós concluímos que o material está caindo através de um horizonte de eventos e está brilhando menos intensamente se ele estivesse se chocando com uma superfície”, disse Kormendy. Embora muito poucos astrônomos duvidem da existência dos buracos negros, esse resultado adiciona mais uma peça ao grande quebra-cabeça de evidências que sugerem que os buracos negros realmente existam na natureza. Estudos prévios, realizados observando buracos negros de massa estelar e o próprio buraco negro supermassivo da Via Láctea, o Sgr A*, também não encontraram evidências de uma superfície.
O novo resultado encontrado na M87, expande a lista de superfícies que não foram detectadas em buracos negros supermassivos para além da nossa galáxia. Essa pode não ser a evidência fina, a própria equipe faz uma crítica. “Eu serei o primeiro a concordar que essa não é uma prova definitiva”, disse Narayan.
“Esse é o tipo de coisa que se prova ser verdadeira, provando-se que a ideia oposta não é verdadeira. Nós estamos provando que não existe uma superfície, assim nós estamos dizendo que deve ser um horizonte de eventos. Essa afirmação lógica não é 100% segura”. A próxima peça desse quebra-cabeça virá uma vez que o projeto do Telescópio de Horizonte de Eventos esteja concluído. Nos próximos anos, o telescópio irá incluir antenas que se espalham do Polo Sul para o Polo Norte, essencialmente criando um único telescópio do tamanho da Terra, que irá conseguir cortar através do gás e da poeira que escondem esses buracos negros supermassivos e aí sim fazer uma imagem da silhueta de um horizonte de eventos.
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