Na vizinhança do nosso Sol na Via Láctea há uma estrela relativamente brilhante e, nela, os astrônomos conseguiram identificar a maior variedade de elementos em uma estrela além do Sistema Solar. O estudo, liderado pelo astrônomo Ian Roederer, da Universidade de Michigan (EUA), identificou 65 desses elementos na estrela, denominada HD 222925. Quarenta e dois dos elementos identificados são elementos pesados listados na parte inferior da tabela periódica de elementos.
HD 222925, no centro da imagem: estrela de nona magnitude localizada em direção à constelação meridional de Tucana. Crédito: The STScI Digitalized Sky Survey
Identificar esses elementos em uma única estrela ajudará os astrônomos a entender o que é chamado de “processo de captura rápida de nêutrons”, ou uma das principais maneiras pelas quais os elementos pesados do universo foram criados. Seus resultados estão publicados no arXiv e foram aceitos para publicação na The Astrophysical Journal Supplement.
“Até onde sei, isso é um recorde para qualquer objeto além do nosso sistema solar. E o que torna essa estrela tão única é que ela tem uma proporção relativa muito alta dos elementos listados nos dois terços inferiores da tabela periódica. Até detectamos ouro”, disse Roederer. “Esses elementos foram feitos pelo rápido processo de captura de nêutrons. Isso é realmente o que estamos tentando estudar: a física para entender como, onde e quando esses elementos foram feitos.”
Elementos raramente detectados
O processo, também chamado de “processo r” (o “r” é de rápido), começa com a presença de elementos mais leves, como o ferro. Então, rapidamente – na ordem de um segundo – nêutrons são adicionados aos núcleos dos elementos mais leves. Isso cria elementos mais pesados, como selênio, prata, telúrio, platina, ouro e tório, do tipo encontrado na HD 222925, e todos raramente detectados em estrelas, de acordo com os astrônomos.
“Você precisa de muitos nêutrons livres e um conjunto de condições de energia muito alta para liberá-los e adicioná-los aos núcleos dos átomos”, afirmou Roederer. “Não há muitos ambientes em que isso possa acontecer – dois, talvez.”
Um desses ambientes foi confirmado: a fusão de estrelas de nêutrons. As estrelas de nêutrons – núcleos colapsados de estrelas supergigantes – são os menores e mais densos objetos celestes conhecidos. A colisão de pares de estrelas de nêutrons causa ondas gravitacionais e, em 2017, os astrônomos detectaram pela primeira vez ondas gravitacionais da fusão de estrelas de nêutrons. Outra maneira pela qual o processo r pode ocorrer é após a morte explosiva de estrelas massivas.
“Esse é um passo importante: reconhecer onde o processo r pode ocorrer. Mas é um passo muito maior dizer: ‘O que esse evento realmente fez? O que foi produzido lá?’”, disse Roederer. “É aí que entra o nosso estudo.”
Modelo de estudo
Os elementos que Roederer e sua equipe identificaram na HD 222925 foram produzidos em supernovas massivas ou em uma fusão de estrelas de nêutrons muito cedo no universo. O material foi ejetado e jogado de volta ao espaço, onde mais tarde se transformou na estrela que Roederer está estudando hoje.
Essa estrela pode então ser usada como uma variável para o que um desses eventos teria produzido. Qualquer modelo desenvolvido no futuro que demonstre como o processo r ou a natureza produz elementos nos dois terços inferiores da tabela periódica deve ter a mesma assinatura da HD 222925, observou Roederer.
Crucialmente, os astrônomos usaram um instrumento no Telescópio Espacial Hubble que pode coletar espectros ultravioleta. Esse instrumento foi fundamental para permitir que os astrônomos coletassem luz na parte ultravioleta do espectro de luz – luz fraca, proveniente de uma estrela fria como a HD 222925.
Impressão digital química
Os astrônomos também usaram um dos telescópios Magellan (consórcio do qual a Universidade de Michigan é parceira) no Observatório Las Campanas, no Chile, para coletar luz da HD 222925 na parte óptica do espectro de luz. Esses espectros codificam a “impressão digital química” dos elementos dentro das estrelas. Sua leitura permite que os astrônomos não apenas identifiquem os elementos contidos na estrela, mas também quanto de um elemento a estrela contém.
Anna Frebel é coautora do estudo e professora de física no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, nos EUA). Ela ajudou com a interpretação geral do padrão de abundância de elementos da HD 222925 e como ele informa nossa compreensão da origem dos elementos no cosmos. “Agora sabemos a saída detalhada, elemento por elemento, de algum evento de processo r que aconteceu no início do universo”, disse ela. “Qualquer modelo que tente entender o que está acontecendo com o processo r deve ser capaz de reproduzir isso.”
Muitos dos coautores do estudo fazem parte de um grupo chamado R-Process Alliance, um conjunto de astrofísicos dedicados a resolver as grandes questões do processo r. Esse projeto marca um dos principais objetivos da equipe: identificar quais elementos, e em que quantidades, foram produzidos no processo r em um nível de detalhamento sem precedentes.
Fonte: Revista Planeta
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