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quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

eROSITA descobre bolhas gigantes no halo da Via Láctea

 

O mapa de todo o céu pelo eROSITA do Observatório SRG como uma imagem em cores falsas (vermelho para energias de 0,3-0,6 keV, verde para 0,6-1,0 keV, azul para 1,0-2,3 keV). A imagem original, com uma resolução de aproximadamente 12", foi modificada a fim de gerar a foto acima.Crédito: Universidade de Tubinga

O primeiro levantamento de todo o céu realizado pelo telescópio de raios-X eROSITA a bordo do observatório SRG (Spektrum-Roentgen-Gamma) revelou uma grande estrutura em forma de ampulheta na Via Láctea. Estas "bolhas eROSITA" mostram uma semelhança impressionante com as bolhas de Fermi, detetadas há uma década a energias ainda mais altas. A explicação mais provável para estas características é uma injeção massiva de energia no Centro Galáctico no passado, levando a choques no invólucro de gás quente da nossa Galáxia. 

Os astrónomos detetaram uma nova característica notável no primeiro mapa de todo o céu produzido pelo telescópio de raios-X eROSITA no SRG: uma enorme estrutura circular de gás quente abaixo do plano da Via Láctea ocupando a maior parte do céu do sul. Uma estrutura semelhante no céu norte, a "espora polar norte", é conhecida há muito tempo e pensava-se que fosse o vestígio de uma velha explosão de supernova. Juntas, as estruturas do norte e do sul, ao invés, são um remanescente de um único conjunto de bolhas em forma de ampulheta emergindo do Centro Galáctico. 

"Graças à sua sensibilidade, resolução espectral e angular, o eROSITA foi capaz de mapear todo o céu em raios-X a uma profundidade sem precedentes, revelando a bolha do sul sem qualquer espaço para dúvidas," explica Michael Freyberg, cientista sénior que trabalha com o eROSITA no Instituto Max Planck para Física Extraterrestre. O eROSITA varre todo o céu a cada seis meses e os dados permitem que os cientistas procurem estruturas que cobrem uma parte significativa de todo o céu. 

Limites acentuados 

A emissão de raios-X em grande escala observada pelo eROSITA na sua banda de energia média (0,6-1,0 keV) mostra que o tamanho intrínseco das bolhas é de vários kiloparsecs (ou até 50.000 anos-luz) de diâmetro, quase tão grande quanto toda a Via Láctea. Estas "bolhas eROSITA" mostram semelhanças morfológicas impressionantes com as bem conhecidas "bolhas de Fermi" detetadas em raios-gama pelo Telescópio Fermi, mas são maiores e mais energéticas. 

"Os contornos nítidos destas bolhas provavelmente traçam choques provocados pela injeção massiva de energia da parte interna da nossa Galáxia no Halo Galáctico," aponta Peter Predehl, autor principal do estudo agora publicado na revista Nature. "Tal explicação tinha sido sugerida anteriormente paras as bolhas de Fermi, e agora com o eROSITA a sua extensão completa e morfologia tornaram-se evidentes." 

Esta descoberta vai ajudar os astrónomos a compreender o ciclo cósmico da matéria dentro e em torno da Via Láctea e das outras galáxias. A maior parte da matéria comum (bariónica) do Universo é invisível aos nossos olhos, com todas as estrelas e galáxias que observamos com telescópios óticos compreendendo menos de 10% da sua massa total. Pensa-se que vastas quantidades de matéria bariónica não observada residam em halos ténues enrolados como casulos em torno das galáxias e dos filamentos entre elas na teia cósmica. Estes halos são quentes, com uma temperatura de milhões de graus e, portanto, visíveis apenas com telescópios sensíveis à radiação altamente energética. 

Enorme libertação de energia 

As bolhas agora observadas com o eROSITA traçam perturbações neste invólucro de gás quente em torno da nossa Via Láctea, provocadas por um surto de formação estelar ou por uma explosão do buraco negro supermassivo no Centro Galáctico. Embora agora dormente, o buraco negro pode muito bem ter estado ativo no passado, ligando-o a núcleos galácticos ativos (NGAs) com buracos negros de crescimento rápido vistos em galáxias distantes. Em qualquer caso, a energia necessária para alimentar a formação destas bolhas gigantescas deve ter sido enorme a 10^56 ergs, o equivalente à libertação energética de 100.000 supernovas, e semelhante às estimativas de explosões dos NGAs. 

"As cicatrizes deixadas por estas explosões levam muito tempo a 'curar' nestes halos," acrescenta Andrea Merloni, investigador principal do eROSITA. "Os cientistas têm procurado no passado impressões digitais gigantescas deste tipo de atividades violentas em torno de muitas galáxias". As bolhas eROSITA fornecem agora forte suporte para interações em grande escala entre o núcleo da nossa Galáxia e o halo em seu redor, que são energéticas o suficiente para perturbar a estrutura, o conteúdo energético e o enriquecimento químico do meio circumgaláctico da Via Láctea. 

"O eROSITA está atualmente a concluir a segunda varredura de todo o céu, duplicando o número de fotões de raios-X provenientes das bolhas que descobrimos," aponta Rashid Sunyaev, cientista-chefe do Observatório SRG na Rússia. "Temos muito trabalho pela frente, porque os dados do eROSITA tornam possível destacar muitas linhas espectrais de raios-X emitidas por gás altamente ionizado. Isto significa que a porta está aberta para o estudo da abundância de elementos químicos, o grau da sua ionização, a densidade e temperatura do gás emitente nas bolhas, para identificar os locais das ondas de choque e estimar escalas de tempo características." 

O IAAT (Institute for Astronomy and Astrophysics) da Universidade de Tubinga, Alemanha, é uma das instituições centrais do consórcio alemão eROSITA; esteve envolvido no desenvolvimento das sete câmaras do telescópio e noutras atividades pré-lançamento, incluindo a avaliação do fundo em órbita e simulações do observatório em ação. Desde o início do levantamento, os cientistas de Tubinga têm trabalhado na análise dos dados à medida que chegam, com foco em objetos galácticos como estrelas de neutrões em acreção, buracos negros, remanescentes de supernova e, claro, as recém-descobertas bolhas eROSITA. 

"Estamos apenas a começar a estudar esta estrutura gigantesca em detalhe e todos os dias recebemos mais luz que transporta informação. Em breve seremos capazes de estudar as condições físicas em várias partes da bolha. Isto é algo que apenas o eROSITA pode fazer, e algo que esperançosamente nos permitirá entender melhor o presente e o passado da nossa própria Galáxia e de outras galáxias onde são observadas várias formas de atividade no núcleo," diz Victor Doroshenko, cientista sénior do IAAT.

"O que mais me impressiona nesta estrutura é a sua vasta extensão, e que permaneceu por descobrir durante a maior parte da nossa história. Isto porque só um levantamento de todo o céu em raios-X poderia revelar uma estrutura tão grande e isto é realmente complexo e envolve enormes desafios técnicos que não puderam ser superados até recentemente. Mesmo agora, projetos a esta escala exigem um esforço conjunto de muitas instituições e nações, e estou feliz que o IAAT possa manter-se competitivo," acrescenta Doroshenko.

Fonte: Astronomia OnLine

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